Religioso da Província dos Capuchinhos de Castela, nasceu em Vegas del Condado, província e diocese de León, na Espanha, a 19 de Setembro de 1904. Após ter concluído os estudos de Filosofia no Seminário diocesano local, ingressou na Ordem Capuchinha em 1929. Nesse mesmo ano fez o noviciado no Convento de Bilbau e, em 8 de Setembro do ano seguinte, emitiu a profissão temporária. Quatro anos depois, em 8 de Setembro de 1933, fez a profissão perpétua no Convento de León e ali recebeu a ordenação sacerdotal em 17 de Março de 1934. Cursou os estudos de Filosofia no Convento de León, de 1924 a 1927, e nesse mesmo Convento fez os de Teologia, de 1927 a 1933.
O Frei Inácio de Vegas veio para Portugal em 11 de Junho de 1936. Instalou-se numa casa adquirida pela Província de Castela em Valinha, junto à fronteira do Minho, situada na freguesia de Ceivães, no concelho de Monção, com um grupo de postulantes espanhóis para irmãos não clérigos e mais dois sacerdotes – os padres Teodósio de Villademor e João José de Bilbau – sendo o seu primeiro Superior. Mas em Abril de 1937 essa casa foi suprimida e o Frei Inácio mudou-se para Barcelos. Em princípios de 1938, transferiu-se para o Porto como Superior duma pequenina casa, cedida pelas Irmãs Franciscanas de Calais, na Rua de são Dinis. Depois de breve passagem por Serpa, em Outubro de 1939 seguiu para Fafe e aí esteve como professor do Seminário Menor até 1941. Acompanhou a mudança do Seminário para o Porto e, algum tempo depois, foi nomeado Director dos Seminaristas, cargo que exerceu até Junho de 1946 sendo, ao mesmo tempo, Superior da Fraternidade, ofício que deixou em 1947.
Nesse ano foi colocado na Fraternidade de Beja e aí esteve até 1953. Em Fevereiro de 1954 foi transferido para Vila Nova de Poiares como professor do Seminário Seráfico. Mas em Junho desse mesmo ano nomearam-no Superior e pároco do Salvador novamente em Beja, cargos que reteve até 13 de Março de 1955. Por inspiração do Alto, aí fundou em 1955 a revista BÍBLICA e a Editorial DIFUSORA BÍBLICA, transitando com elas para Lisboa no ano seguinte a fim de se dedicar, a tempo inteiro, ao “Movimento Bíblico” por ele iniciado na nossa Fraternidade de Beja e oficialmente aprovado pelo então Comissário Geral, Frei Cornélio de San Felices, em 25 de Fevereiro de 1955.
Esta aprovação formal apontava para um objectivo muito concreto:
Difundir e dar a conhecer a Palavra de Deus por meio de edições económicas da mesma.
Formar cristãos solidamente instruídos, dando-lhes assim a conhecer o Cristo histórico, nosso Redentor, Mestre e Modelo.
Responder ao apelo dos últimos Papas nas encíclicas “Providentissimus Deus”, “Spiritus Paraclitus” e “Divino Afflante Spiritu” para formar novas cristandades, familiarizando os fiéis com os livros da Sagrada Escritura.
Trabalhou incansavelmente entre nós durante trinta anos, onze dos quais dedicado ao serviço profético da difusão da Bíblia. A instâncias dos seus Superiores de Espanha, regressou definitivamente à sua Província em 1966. Já em 1965 tinha fundado a Difusora Bíblica em Madrid e esteve também directamente ligado ao aparecimento da revista Evangelio y Vida, que começou a ser editada pelos seus confrades espanhóis em 1959. Na América Latina, para onde partiu em 4 de Fevereiro de 1967, fundou a revista Orientación Bíblica em 1986 e abriu a Difusora Bíblica no México e em Bogotá. Percorreu todos os países latino-americanos, além de parte dos Estados Unidos, Canadá e Brasil, consumido pelo seu incontornável desejo de difundir, ao perto e ao longe, a Palavra de Deus. Fruto de um profundo discernimento interior, pressentiu ser esse o chamamento especial que Deus lhe fazia dentro da vocação geral à Ordem Franciscana, cuja Regra fundamental é “viver o Santo Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo”. E, a partir daí, descobriu “o tesouro escondido” (Mt 13,44) e “a pérola preciosa” (Mt 13,45) – o serviço da Palavra de Deus – e converteu-a na paixão e obsessão da sua vida.
A vida e obra do Frei Inácio de Vegas ficarão para sempre ligadas, como um marco indelével, à história da nossa Província. Andarilho e contemplativo, hábil em arranjar financiamentos para as edições bíblicas e profundamente pobre, especulativo e prático, atento à vida e desprendido dela, o Frei Inácio foi o fundador do Movimento Bíblico em Portugal e durante muitos anos a alma desse movimento. Nunca perdia a esperança quando os critérios dos seus Superiores pareciam opor-se ao imperativo apostólico que em consciência julgava ser de Deus. E sempre encontrou forma de os harmonizar, sem inflectir muito o rumo da sua opção. Religioso austero e zeloso, de saúde férrea, foi um verdadeiro carismático da Palavra de Deus, que procurou difundir, através de edições completas ou parciais da Bíblia, de Norte a Sul do país, transformado em “caixeiro-viajante” da Palavra do Senhor. Iniciou em Portugal, de maneira constante e mais tarde organizada, uma obra ímpar que tornou os Capuchinhos credores da admiração de toda a gente, aquém e além fronteiras: o apostolado bíblico – que se traduziu num movimento imparável de dinamização bíblica, animado por Encontros, Cursos Bíblicos, Semanas de Estudo a nível nacional e diocesano, e por milhares de Grupos Bíblicos espalhados pelas paróquias de Portugal, das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, e também de alguns países do Continente europeu.
Por tudo isto, o Frei Inácio, antecipando-se ao Concílio Vaticano II, foi considerado o maior apóstolo da Sagrada Escritura na segunda metade do século XX e a pessoa que de modo persistente dedicou a sua vida a iniciar o Povo de Deus na leitura crente da Bíblia, tanto para o despertar como para o fortalecer na fé. Daí o seu lema permanentemente repetido: “Menos palavras dos homens e mais Palavra de Deus”. O seu objectivo era conduzir as pessoas Àquele que é a Palavra e não tanto às suas palavras. Aliás, a sua vida era comandada pelo sonho de colocar uma Bíblia em cada lar e uma Escola Bíblica em cada paróquia. Chegou inclusivamente a escrever a alguns Ministros Provinciais para sugerirem aos Bispos a adopção da Bíblia como Catecismo nas suas dioceses, pois, para ele, esse era o caminho mais pedagógico e seguro para chegar ao Verbo incarnado e aderir a Ele de todo o coração. E isto era fruto do cristocentrismo da sua fé e do seu apostolado com base na Palavra de Deus entregue e explicada ao povo.
Com o seu carisma profético, o Frei Inácio deixou-nos um legado muito importante nos seus livros, nos seus opúsculos bíblicos, nas suas edições do texto sagrado, nas revistas que fundou e difundiu em Portugal, em Espanha e na América Latina, nas associações e centros de animação bíblica a que deu vida. Mas nele havia ainda um rasgo mais importante que o da sua desbordante actividade bíblica: era a sua espiritualidade bíblica. Ele não era só o difusor da Bíblia; a Bíblia era a sua casa: vivia a Palavra e na Palavra. Antes de meter a Bíblia na sua sacola para sair à rua, tinha-a metido no seu coração numa oração profunda e prolongada. Todos os dias, antes de amanhecer – era a sua norma porque repousava muito pouco – seleccionava um ou dois versículos que convertia em tema de oração e reflexão ao longo de toda a jornada. A mensagem da Palavra configurou a sua vida como peregrino; sentia a urgência da Palavra dentro de si mesmo, e isso levava-o a superar “incompreensões” que encontrou ao longo da vida. E foi esse seu “gosto” pela Palavra de Deus, assimilada e “saboreada” na oração que, num corpo frágil, fez dele um grande profeta do seu tempo. E os verdadeiros profetas nunca morrem porque fica a sua mensagem, que é a essência e a alma do profeta.
Estava prestes a fazer 98 anos quando nasceu para a eternidade e para a sua plena comunhão com a Pessoa de Deus-Palavra, em 25 de Agosto de 2002 no Convento do Sagrado Coração de Jesus, em Usera, Madrid, onde tinha fixado residência ao regressar da América Latina em 1994. Contava 72 anos de vida religiosa e 68 de sacerdócio.