03 de abril
V DOMINGO DA QUARESMA
Leituras: 1ª: Is 43,16-21. Salmo: 126/125,1-6. R/ Grandes maravilhas fez por nós o Senhor. 2ª: Fil 3,8-14. Evº: Jo 8,1-11. I Semana do Saltério.
“VAI E NÃO VOLTES A PECAR”
Jesus Cristo introduz a novidade do perdão e da misericórdia perante a antiga condenação em nome da Lei. A conversão proposta pelo evangelho do Quinto Domingo da Quaresma (Ano C) consiste em abrir o coração ao dom do perdão, sem juízos, sem prévias condenações. Em nome da Lei, os escribas e os fariseus sugerem a condenação da «mulher surpreendida em adultério». Em nome da Lei (do Amor), Jesus Cristo obtém a absolvição e propõe a conversão: «Vai e não tornes a pecar».
Há uma sentença que inverte o desfecho previsto: «Quem de entre vós estiver sem pecado atire a primeira pedra». Os escribas e os fariseus passam de acusadores a acusados. «O primeiro olhar de Jesus nunca se dirige para o pecado das pessoas, mas sempre para o sofrimento» (Johann Baptist Metz). O diálogo com a mulher confirma este olhar: não destaca a culpa e os pecados, não impõe castigos nem humilha o ser humano; abre os corações à misericórdia, liberta a pessoa da escravidão do pecado, oferece a salvação, indica a Lei do Amor (que o próprio há de consumar plenamente na morte na cruz).
Jesus Cristo dá «um futuro a quem já não tinha nenhuma esperança de futuro […]. A Lei, mesmo a lei santa de Deus, e ainda mais, portanto, as leis da Igreja necessitam de uma interpretação humana inspirada na misericórdia. Sem humanidade, a lei pode matar, esmagar, humilhar. Para Jesus, mais do que o mandamento infringido, é importante, dali para a frente, a mulher cuja vida se rompeu, com o pecado que marcou a sua vida e a sua família» (Luciano Manicardi).
10 de abril
DOMINGO DE RAMOS
Leituras: 1ª: Is 50,4-7. Salmo: 22/21,8-9.17-18a.19-20.23-24. R/ Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes? 2ª: Fil 2,6-11. Evº: Lc 22,14–23,56. II Semana do Saltério.
“PAI, PERDOA-LHES, PORQUE NÃO SABEM O QUE FAZEM”
O primeiro dia da Semana Santa é um introito paradoxal da glória e da paixão: Jesus Cristo, aclamado como o enviado de Deus, acaba a sofrer a rejeição daqueles para quem foi enviado. Mas o Mestre vive ao limite a fidelidade ao amor. O Domingo de Ramos propõe a leitura da Paixão de Jesus Cristo.
Neste caso (Ano C), o relato destaca a grandeza humana de Jesus Cristo, através de detalhes próprios, como o olhar misericordioso aquando da negação de Pedro, a autoridade diante do sumo-sacerdote, o silêncio perante Herodes, a declaração de inocência por parte de Pilatos, o acolhimento da prece do ladrão, o perdão aos verdugos.
A cruz aponta para a plenitude da misericórdia e, nela, Jesus Cristo acrescenta um pedido: «Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem». Perdoar aos seus algozes? Sim, pois só a misericórdia é fonte de vida.
«Um Deus que morre por amor, algo que não consigo compreender, perene desafio para a minha razão e que, no entanto, cada vez, me chama, me desarma e me fere. A cruz não se entende, contempla-se. […] Olho com os olhos do coração. E vejo um Deus louco de amor, disposto a tudo por mim […]. Contemplo a cruz, vejo-o pender nu e desonrado e tenho de desviar o olhar. Depois, viro ainda a cabeça, olho a cruz e vejo alguém com os braços escancarados que me grita: amo-te» (Ermes Ronchi); perdoo-te todos os teus pecados; vai em paz.
O perdão desperta em mim a esperança. Perante tanto amor, posso continuar a ficar indiferente?
17 de abril
DOMINGO DE PÁSCOA
Leituras: 1ª: At 10,34a.37-43. Salmo: 118/117,1-2.16ab-17.22-23. R/ Este é o dia que o Senhor fez: exultemos e cantemos de alegria. 2ª: Col 3,1-4. Evº: Jo 20,1-9. I Semana do Saltério.
“VIU E ACREDITOU”
O acontecimento da Morte e Ressurreição de Jesus Cristo celebra-se, com solenidade, em toda a cinquentena pascal como se de um único dia se tratasse: cinquenta dias repletos de «Aleluia».
«No primeiro dia da semana» - assim começa o fragmento evangélico do Primeiro Domingo de Páscoa (Ano C). De então para cá, cada domingo é o primeiro dia da semana, o dia da ressurreição de Jesus Cristo. Celebrar o domingo é assumir o núcleo da fé cristã: a vitória de Jesus Cristo sobre a morte, fonte da qual brota a nossa própria vitória.
A eucaristia, no centro do primeiro dia da semana, lembra-nos que somos salvos por Jesus Cristo morto e ressuscitado. A ação de ver e acreditar, mais do que uma realidade física, remete para a experiência pascal, não só dos primeiros, mas também dos discípulos de todos os tempos. Na verdade, o evangelho segundo João está repleto de referências à ação de acreditar como resposta adequada diante de Jesus Cristo. De notar que a expressão «viu e acreditou» não está associada a um nome próprio, mas ao «outro discípulo que Jesus amava», o que permite colocar-nos a todos nesse personagem.
A ressurreição de Jesus Cristo ultrapassa os limites do espaço e do tempo. Cada um de nós está envolvido neste acontecimento pascal que nos enche de gozo e de alegria. Cada uma das nossas histórias está atravessada pelo mistério da morte e ressurreição do Senhor. Por isso se aplica também a nós o mesmo processo vivido pelo discípulo: «viu e acreditou».
24 de abril
II DOMINGO DE PÁSCOA
Leituras: 1ª: At 5,12-16. Salmo: 118/117,2-4.22-24.25-27a. R/ Dai graças ao Senhor, porque Ele é bom, porque é eterna a sua misericórdia. 2ª: Ap 1,9-11a.12-13.17-19. Evº: Jo 20,19-31. II Semana do Saltério.
“FELIZES OS QUE ACREDITAM”
Hoje, como Tomé, continuamos hesitantes, paralisados pelas dúvidas. Uma e outra vez, gostaríamos que se nos fosse dado a ver. É, na verdade, uma grande falta de visão (em sentido figurado) que nos impede de viver a fé com entusiasmo e de a comunicar com alegria. Esquecemo-nos que «’ser crente’ não significa poder alijar para sempre o fardo das questões árduas e espinhosas. Por vezes, significa tomar sobre si a cruz da dúvida e, com esta cruz, seguir ainda fielmente a Jesus. A força da fé não consiste na ‘imperturbabilidade da convicção’, mas na capacidade de suportar também as dúvidas, as obscuridades, de suster o peso do mistério - mantendo a lealdade e a esperança» (Tomáš Halík).
Eis que de novo ecoa no coração desse Tomé que nos habita: «Felizes os que acreditam sem terem visto». O medo dos discípulos entrincheirados dá lugar a uma valorosa alegria. A dúvida de Tomé dá lugar à profissão de fé. Cheios do Espírito Santo, já não têm medo de abrir as portas para proclamar a Boa Notícia.
A nova bem-aventurança aponta para uma dinâmica transversal à Sagrada Escritura. Luigi Maria Epicoco, presbítero italiano, assinala que «o verbo mais importante da Bíblia não é ‘ver’, mas ‘escutar’».
A fé acontece quando passamos do desejo de ver à disponibilidade para escutar. É a revelação de uma Presença que «só se pode ver escutando-a. Os nossos olhos, na realidade, coincidem com a nossa capacidade de escutar. Esta obediência profunda, esta escuta profunda e radical, é aquilo a que chamamos discipulado. Uma pessoa é discípula quando escuta a sua Presença».
01 de maio
III DOMINGO DE PÁSCOA
Leituras: 1ª: At 5,27b-32.40b-41. Salmo: 30/29,2.4-6.11-12a.13b. R/ Eu vos louvarei, Senhor, porque me salvastes. 2ª: Ap 5,11-14. Evº: Jo 21,1-19. III Semana do Saltério.
“É O SENHOR”
O encontro com o Ressuscitado, mais do que uma realidade visível, é uma experiência que, a partir dos «olhos» do coração, capacita a confessar a fé na sua presença.
A parte final do evangelho segundo João, no Terceiro Domingo de Páscoa (Ano C), dá a conhecer uma «aparição» do Ressuscitado: Jesus Cristo manifesta-se no lago de Tiberíades, aquele lago onde se tinham vivido momentos determinantes na missão do Mestre e dos discípulos. Ali, alguns deles foram chamados pela primeira vez. Antes, havia sido num dia de tempestade que aprenderam a confiar naquele que dormia na barca. Agora, é «ao romper da manhã», e não no meio da noite da tormenta, que Jesus Cristo volta a chamar os discípulos. Não é a noite da morte, mas a manhã da ressurreição. Já passou a noite, agora é tempo de viver a manhã do novo dia: o Mestre convida-os a deixar a obscuridade da cruz e a noite da desilusão, para viver a esperança na vida ressuscitada e a confiança da vitória.
A leitura orante desta cena, mais do que uma «aparição» do Ressuscitado, evidencia a «ressurreição dos discípulos: uma narração em que a passagem da noite para a manhã, portanto, das trevas para a luz, é acompanhada da passagem da ignorância ao conhecimento de Jesus, da esterilidade à pesca abundante, de não ter nada para comer a participar na refeição farta de Jesus» (Luciano Manicardi).
Hoje, é no meio dos nossos desânimos e fracassos que Jesus Cristo nos chama a uma nova atitude para também o reconhecermos presente junto de nós: «É o Senhor»
08 de maio
IV DOMINGO DE PÁSCOA
Leituras: 1ª: At 13,14.43-52. Salmo: 100/99,2.4.5.6.11.12.13b. R/ Nós somos o povo de Deus, somos as ovelhas do seu rebanho. 2ª: Ap 7,9.14b-17. Evº: Jo 10,27-30. IV Semana do Saltério.
“DOU-LHES A VIDA ETERNA”
O Ressuscitado convida a uma relação pessoal, sob a imagem do pastor e das ovelhas, na qual o exemplo maior vem do pastor. O breve trecho proposto para este ano litúrgico (Ano C) destaca o conhecimento mútuo que se apoia na também profunda relação entre o Filho (Jesus Cristo) e o Pai (Deus). Dela brota uma dádiva e uma promessa: «Eu dou-lhes a vida eterna e nunca hão de perecer».
A vida eterna não pode ser entendida em chave cronológica, como se fosse uma realidade apenas futura ou que remete para um suposto tempo sem termo. A eternidade não se aplica a uma medida de tempo (sem medida), é uma qualidade de Deus, pelo que a vida eterna é participar de Deus, ser envolvido pelo ser de Deus, o Amor.
São Gregório Magno fala do «rosto de Deus, sempre presente: e quando o contemplamos sem interrupção, a alma fica saciada com o alimento da vida». E exorta: «Que a nossa fé sinta o calor daquilo em que acreditamos, que os bens do alto incendeiem os nossos desejos. Amar assim é já estar a caminho», é já saborear hoje a vida eterna.
Na Carta Encíclica sobre a esperança cristã, Bento XVI explica: «a única possibilidade que temos é procurar sair, com o pensamento, da temporalidade de que somos prisioneiros e, de alguma forma, conjeturar que a eternidade não seja uma sucessão contínua de dias do calendário, mas algo parecido com o instante repleto de satisfação, onde a totalidade nos abraça e nós abraçamos a totalidade. Seria o instante de mergulhar no oceano do amor infinito, no qual o tempo – o antes e o depois – já não existe».
15 de maio
V DOMINGO DE PÁSCOA
Leituras: 1ª: At 14,21b-27. Salmo: 144,8-13ab. R/ Louvarei para sempre o vosso nome, Senhor, meu Deus e meu Rei. 2ª: Ap 21,1-5a. Evº: Jo 13,31-33a.34-35. I Semana do Saltério.
“AMAI-VOS TAMBÉM UNS AOS OUTROS”
O Quinto Domingo de Páscoa (Ano C) realça o amor que brota do Ressuscitado para se tornar a identidade dos cristãos. Uma das conclusões que os primeiros cristãos retiraram da experiência pascal foi a importância do amor: a ressurreição é um ato de amor, um amor que vence a morte. Não é uma palavra vazia, saída da boca. Não é uma palavra banalizada pelo uso corrente nos mais diversos contextos. À luz da experiência pascal, é uma palavra cheia de sentido, expressa a dádiva de Jesus Cristo, desafia os discípulos a assumirem a mesma missão, isto é, a serem discípulos missionários.
Este testemunho tem um critério claro: «Como Eu vos amei». E como é o amor de Jesus Cristo? Não é uma ideia filosófica ou abstrata. É uma maneira concreta de amar. Não é uma palavra. É a vida. Tomemos os evangelhos e busquemos essa concretização do amor à maneira do Mestre, desde a preferência pelos marginalizados, passando pela atenção a qualquer que seja o nosso próximo, mesmo que seja um inimigo, até à doação total da vida. Um amor assim pode parecer impossível ou muito difícil, demasiado exigente. Só é possível amar assim a partir da nossa relação com Jesus Cristo. Cirilo de Alexandria afirmou que a «forma e figura de Cristo é o amor». Quanto mais profunda for a nossa adesão ao Mestre, maior será a nossa aproximação ao irmão. O gesto da fração do pão é eloquente: parte-se para ser repartido; partido e repartido faz de todos um só corpo, um corpo alimentado pelo amor.
22 de maio
VI DOMINGO DE PÁSCOA
Leituras: 1ª: At 15,1-2.22-29. Salmo: 67/66,2-3.5.6.8. R/ Louvado sejais, Senhor, pelos povos de toda a terra. 2ª: Ap 21,10-14.22-23. Evº: Jo 14,23-29. II Semana do Saltério.
“VOLTAREI PARA JUNTO DE VÓS”
A missão da Igreja nasce da Páscoa (e Pentecostes). O seu tempo desenvolve-se entre a primeira e a segunda vinda do Senhor. No contexto da ‘despedida’, aquando da primeira vinda (histórica), o Mestre deixa a garantia: «voltarei para junto de vós».
A Igreja existe para evangelizar, para anunciar a Páscoa. Jamais se pode esquecer que a sua identidade e missão se apoia no facto de ser discípula missionária de Jesus Cristo. Este alerta surge no texto do evangelho proposto para o Sexto Domingo de Páscoa (Ano C), no qual o Mestre aborda as verdades elementares que nos tornam cristãos: o amor a Deus (Pai), a escuta da Palavra (Filho), a vida animada pelo Espírito Santo.
Ao ler/escutar que Jesus Cristo promete ‘voltar’ para junto de nós, não podemos ficar agarrados apenas a uma perspetiva futura, a um acontecimento «distante, imponente e grandioso», mas a um acontecimento «chamado a verificar-se hoje no oculto do coração humano. Só homens e mulheres tornados morada da vida trinitária, conscientes da vida divina em si, sabem narrar e anunciar o Reino de Deus universal» (Luciano Manicardi).
A promessa de ‘voltar’ para junto de nós, compromete-nos hoje a ‘voltar’ para ele: ‘voltar’ a Jesus Cristo, colocá-lo no centro da nossa vida, é indispensável para cada cristão e para a Igreja, comunidade dos discípulos missionários. Permitir que a existência seja impregnada pelo Ressuscitado é o autêntico caminho do discipulado.
29 de maio
ASCENSÃO DO SENHOR
Leituras: 1ª: At 1,1-11. Salmo: 47/46,2-3.6-7.8-9. R/ Por entre aclamações e ao som da trombeta, ergue-Se Deus, o Senhor. 2ª: Ef 1,17-23. Evº: Lc 24,46-53. III Semana do Saltério.
“BENDIZENDO A DEUS”
Jesus Cristo, morto e ressuscitado, é o centro do anúncio, tal como tinha sido predito nas Escrituras. Os discípulos, suas testemunhas, fortalecidos pela bênção e promessa da Ascensão, «estavam continuamente no templo, bendizendo a Deus». No final do texto evangélico da solenidade da Ascensão (Ano C) destaca-se o papel dos discípulos. As três expressões que lhes são atribuídas («prostraram-se diante de Jesus… voltaram para Jerusalém com grande alegria… estavam continuamente no templo, bendizendo a Deus») excluem a ideia de uma despedida triste e dolorosa, e corroboram a continuidade da missão.
Bendizer a Deus é sentir-se agradecido, louvar o seu amor, como forma de testemunhar a sua ação e presença na nossa vida. «Testemunhar é dar um rosto àquele que não está visível. O testemunho não é, portanto, quantitativamente mensurável, mas situa-se no plano inefável do ser: o rosto é o único ícone do divino» (Luciano Manicardi).
O cristão assume um rosto alegre, em qualquer circunstância, encarna e atualiza na própria vida a presença do Ressuscitado.
A nossa missão é «fazer que o cristianismo penetre no mais profundo das realidades humanas, mas sem deixar que, precisamente, ele se perca ou se desnaturalize nelas. Não para o esvaziar da sua substância espiritual, mas para que atue na alma e na sociedade como fermento que faz crescer a massa, para que torne tudo sobrenatural. Para que no interior de tudo se estabeleça um princípio novo» (Henri de Lubac).