Uma verdadeira aventura
70 anos e o futuro do Apostolado Bíblico dos capuchinhos
Apostolado Bíblico dos Capuchinhos de Portugal – 70 anos (1951-2021) é o título do livro do franciscano capuchinho frei Lopes Morgado, que recentemente ficou disponível para os interessados. Nele, o ex-director da revista Bíblica conta a história de um percurso rico de iniciativas, movimentos e edições. Iniciado em 1951 pelo espanhol frei Inácio de Vegas, o Movimento de Dinamização Bíblica da Igreja Católica em Portugal atravessou as últimas sete décadas, nelas cruzando o II Concílio do Vaticano e a revolução do 25 de Abril de 1974.
Os 70 anos cobertos pela história do livro são um “número simbólico de uma vida de ‘trabalho e misérias’, segundo um dos salmos citados. Envolvido naquele Movimento desde 1965, Lopes Morgado também vinha acompanhando desde 1988 a sua história, que agora sintetiza nesta obra.
Tendo em conta a importância do livro para o conhecimento de uma faceta importante da história contemporânea do catolicismo português, o 7MARGENS publica a seguir excertos da introdução e do último capítulo da obra, sobre o futuro deste Movimento.
«Visto que muitos empreenderam compor uma narração dos factos que entre nós se consumaram, como no-los transmitiram os que desde o princípio foram testemunhas oculares e se tornaram servidores da Palavra, resolvi também eu, depois de tudo ter investigado cuidadosamente desde a origem, expô-los a ti por escrito e pela sua ordem, caríssimo Teófilo, a fim de reconheceres a solidez da doutrina em que foste instruído.»
(Evangelho segundo Lucas 1,1-4)
(…) Esta é já a sexta vez que me debruço, por escrito, sobre o Apostolado Bíblico dos Irmãos Menores Capuchinhos de Portugal, nomeadamente sobre a [editora] Difusora Bíblica e a revista Bíblica, fundadas em Beja a 25 de fevereiro de 1955 pelo capuchinho espanhol frei Inácio de Vegas. Mas só desta vez me proponho fazer a sua História completa e tanto quanto possível exaustiva.
A ideia de avançar com esta obra surgiu-me ao ver tanta iniciativa adiada pela pandemia da covid-19 e outras derivantes, com pessoas a partirem sem nos podermos despedir delas nem lhes prestarmos a honra e glória merecidas com a sua vida, por causa das precauções sanitárias. E de repente, apercebi-me de que também muitas pessoas que tanto se empenharam no Apostolado Bíblico foram partindo sem recordar a sua história, ou já abandonaram a vida ativa de muitos anos.
Era, pois, urgente registar em livro esses novos “feitos dos apóstolos” de hoje, para deles se fazer memória futura e deles surgirem novos impulsos de evangelização. Creio que não foi outra a intenção com que Deus inspirou S. Lucas, quando este escreveu os Atos dos Apóstolos. Nem tinha sido outra a sua intenção ao escrever o Evangelho, como se lê no Prólogo transcrito à cabeça desta Introdução. Aliás, dentro do critério pedagógico de tradição na cultura bíblica, o que recebemos é para ser testemunhado e transmitido:
«O que ouvimos e aprendemos
e os nossos antepassados nos transmitiram,
não o ocultaremos aos seus descendentes;
tudo contaremos às gerações vindouras:
as glórias do Senhor e o seu poder,
e as maravilhas que Ele fez.
………………………………….para que as gerações futuras o conhecessem
e os filhos que haviam de nascer
o contassem aos seus próprios filhos;
para que pusessem em Deus a sua confiança
e não esquecessem as suas obras,
mas obedecessem aos seus mandamentos» (Salmo 78/77,3-4.6-7).
A estrutura
Colocando 2021 como ano limite no horizonte desta pesquisa, o título de 70 ANOS saiu de uma soma rápida: a primeira carta de frei Inácio de Vegas e o seu primeiro livro são de 1951; ora, de 1951 para 2021 vão 70! Pareceu-me um bom número, até pela sua ressonância bíblica no salmo 90, versículo 10:
«A duração da nossa vida poderá ser de setenta anos
e, para os mais fortes, de oitenta:
mas a maior parte deles é trabalho e misérias,
passam depressa e nós desaparecemos.» (…)
(…) segui os passos da história e dividi este livro em épocas diferentes, algumas um tanto convencionais por falta de uma referência evidente que as enquadrasse.
(…) Esta História, como a Bíblia, também nasceu da Vida. E assim vo-la entrego, ao natural, sem “perspetiva” histórica nem académica, por considerar que nesta fase ainda não poderá ser feita com justeza nem justiça. Mas não me demiti de enquadrar os factos de cada período no conjunto da Igreja, do País e do Mundo, abrindo caminho a essa “perspetivação” no futuro.
“Pusemos a Bíblia no mapa”
(…) Encerrar a história do Apostolado Bíblico no ano 2021, em que a maioria das atividades foram suspensas por causa da pandemia, não me leva a concluir que tudo acabou. Mas é uma boa ocasião para analisar serenamente o percurso feito, ver o que poderemos ainda fazer e decidir por onde recomeçar. No fim de contas, embora noutro contexto, o que o ministro geral da nossa Ordem, frei John Corriveau, no cinquentenário da Difusora Bíblica e da Revista, nos aconselhava a fazer: «contemplar o trabalho realizado, dar graças ao Senhor pela sementeira feita, corrigir possíveis erros e impulsionar, com ânimo sempre renovado, o trabalho do futuro». (…)
Sem pretendermos atribuir-nos o mérito, o facto é que várias causas, pelas quais lutámos sozinhos durante muitos anos, são hoje publicamente assumidas sem rebuço: reflexão bíblica nos encontros e atividades de todos os movimentos eclesiais credíveis, presença visível e permanente da Bíblia nas igrejas, Domingo da Palavra de Deus, opção anual ou trienal pela Bíblia nas dioceses, uso da Bíblia na catequese, as Escolas Bíblicas, a prática da Lectio divina, etc.. Pusemos a Bíblia no mapa!
Uma proposta simples e abrangente
(…) Atendendo à proliferação de movimentos, às muitas solicitações das mesmas pessoas, à diminuição de jovens na população do nosso País, bem como à carência de agentes pastorais qualificados, manda o realismo que a nossa proposta pastoral no campo bíblico se oriente neste sentido:
a) numa família que se diga cristã e queira ser “igreja doméstica”, haja uma Bíblia por onde se faça a leitura orante individual e familiar;
b) numa comunidade que se pretenda congregada e animada pela Palavra, haja um Grupo de “leitura orante da palavra” (e não vários), aberto a toda a gente, com encontro semanal num dia, lugar e hora avisados pelo pároco de forma habitual, cuja animação, a critério do mesmo pároco, poderia ser eventualmente assumida pelos Animadores ou Ministros da Palavra preparados por nós;
c) num arciprestado ou região pastoral que deseje ser ativa e construtora de uma Igreja credível no mundo de hoje, haja uma Escola da Palavra, com encontro mensal, para formação permanente e atualização dos seus quadros, que reúna as forças vivas das várias paróquias;
d) numa diocese que se proponha animar toda a sua pastoral com a Bíblia, haja um Secretariado ou Departamento para congregar e unificar – nunca para uniformizar – esta ação, fundamental na Igreja de hoje. (…)
A Bíblia perto do povo
A forma de manter a Bíblia perto do povo seria a descentralização do Movimento Bíblico através dos Secretariados Regionais. (…)
Da sua importância e atividade, puderam os leitores aperceber-se ao longo destas páginas. Os seus membros colaboravam na preparação e participavam em equipas na realização da Semana Bíblica Nacional, do Encontro Nacional dos Grupos Bíblicos, dos Encontro Regionais dos Grupos Bíblicos e dos Cursos de Agentes de Pastoral Bíblica. Além disso, empenhavam-se em garantir o “Dia da Palavra de Deus” nas paróquias onde viviam, animando a Eucaristia e organizando tempos de reflexão e de convívio abertos ao meio; preocupavam-se com a sua própria formação, a vida dos Grupos Bíblicos da sua zona e a animação bíblica da sua pastoral, convidando e custeando conferencistas para essas ações, quando necessário; vários membros não se inibiam, mesmo, de orientar o 1º Curso Base ou outros cursos monográficos, como o do Evangelista do ano ou o tema bíblico do ano lançado na Semana Bíblica Nacional, com apoio das conferências publicadas na revista Bíblica/série científica.
Mas, desses Secretariados, já quase nenhum existe. E como, da nossa parte, diminuiu radicalmente a capacidade para os reanimar e manter, resta-nos aceitar as coisas como são e muito cordialmente agradecermos tudo o que fizeram pela Palavra de Deus e pelo próprio Movimento Bíblico.
Fechar um capítulo, observar sempre o Evangelho
(…) fechar este capítulo do passado não supõe abrir uma crise no presente ou no futuro; os Capuchinhos continuaremos a professar: «A Regra e Vida dos Irmãos Menores é esta: observar o santo Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo.» E, para mantermos esta nossa identidade, “só” precisamos de cumprir as Constituições que a interpretam. Nomeadamente, o que o novo texto, promulgado em 18 de maio de 2014, nos recomenda no nº 150:
[4] «Com suma dedicação, esforcemo-nos por imprimir no nosso coração a Palavra de Deus, que é Cristo, e, com todas as forças, demos-Lhe posse total de nós mesmos para que seja o próprio Senhor que nos impele a falar por superabundância de amor. Assim, anunciaremos a Cristo com a vida, com as obras e com a palavra.
[5] Para atingir este objetivo, esforcemo-nos em progredir continuamente na sabedoria de Cristo, que se adquire sobretudo vivendo-a, e isto especialmente com a leitura assídua, a meditação e o estudo aprofundado das Sagradas Escrituras.
[6] Procuremos que todo o nosso serviço seja impregnado pela Palavra de Deus. Cuidemos a catequese da fé com métodos apropriados às exigências dos diversos grupos humanos, favorecendo a afirmação de uma cultura permeada pelos valores evangélicos.»
Este é o programa de vida comum a todos os franciscanos capuchinhos do mundo. Dentro deste espírito, na nossa Ordem só a Província Portuguesa tinha feito a opção preferencial pelo apostolado bíblico, para salvaguardar a herança recebida de frei Inácio de Vegas. Em 2022, o ministro geral da Ordem faz a visita pastoral à nossa Província Portuguesa; e em 2023 temos o Capítulo Provincial com todos os Irmãos de votos perpétuos. Nele iremos rever a caminhada feita nos últimos três anos. Poderá ser a melhor ocasião para decidirmos, comunitariamente, quanto ao futuro do nosso apostolado bíblico. […]
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Apostolado Bíblico dos Capuchinhos de Portugal – 70 anos (1951-2021)
Autor: Lopes Morgado
Difusora Bíblica, Fátima.
742 págs., 25€.
Para abrir o site da Difusora Bíblica clique aqui.