Na sexta-feira, dia 12 de novembro, o Papa Francisco fez uma visita simbólica a Assis para lançar a celebração do V Dia Mundial dos Pobres em toda a Igreja, e criticou a “hipocrisia” da sociedade, que culpabiliza as pessoas pobres pela sua condição, afirmando que “é hora” de lhes devolver a palavra e a dignidade que merecem.
“Às vezes, ouvimos dizer que os pobres são os responsáveis pela pobreza. Mais um insulto! Para não fazer um sério exame de consciência sobre os próprios atos, sobre a injustiça de algumas leis e medidas económicas, um exame de consciência sobre a hipocrisia de quem quer enriquecer excessivamente, lança-se a culpa sobre os ombros dos mais fracos”, referiu Francisco, num encontro promovido em Assis para assinalar o V Dia Mundial dos Pobres, que a Igreja Católica celebra no próximo domingo.
Na cidade italiana, “que tem o rosto de São Francisco”, o Papa evocou a vida do santo de Assis, que ensinou a partilhar tudo com os outros. A celebração de “oração e testemunho” decorreu junto à Porciúncula, uma das igrejas que São Francisco pensou em restaurar, hoje dentro da Basílica de Santa Maria dos Anjos, onde o pontífice rezou em silêncio.
“A primeira marginalização de que sofrem os pobres é a espiritual. Por exemplo, muitas pessoas e muitos jovens encontram algum tempo para ajudar os pobres e levar-lhes comida e bebidas quentes. Isso é muito bom e agradeço a Deus pela generosidade. Mas, acima de tudo, fico feliz quando ouço que esses voluntários param um pouco para conversar com as pessoas, e às vezes rezam juntamente com elas”, assinalou o Papa.
A intervenção sublinhou a importância de “acolher”, para os católicos, “abrir a porta, a porta da casa e a porta do coração”, sem “virar a cara para o outro lado”.
É hora de abrir os olhos para ver o estado de desigualdade em que vivem tantas famílias. É hora de arregaçar as mangas para restaurar a dignidade com a criação de empregos. É hora de voltar a escandalizar-se com a realidade de crianças famintas, escravizadas, sacudidas pelas águas na agonia de naufrágios, vítimas inocentes de todo o tipo de violência”.
Francisco agradeceu a participação de todos numa iniciativa que nasceu de uma proposta de um homem desfavorecido, considerando que “é hora de os pobres receberem de volta a sua palavra”.
“Que este encontro abra o coração de todos nós para nos colocarmos à disposição uns dos outros, para fazer da nossa fraqueza uma força que nos ajuda a continuar o caminho da vida, para transformar a nossa pobreza numa riqueza a ser partilhada e, assim, melhorar o mundo”, apelou.
O Papa, que fez uma visita-surpresa à Basílica de Santa Clara para um breve encontro com a comunidade religiosa das Clarissas, passou vários minutos a cumprimentar as pessoas que o esperavam em Assis, com particular atenção às crianças.
O encontro de oração e testemunho começou com um “abraço” virtual no átrio da Basílica de Santa Maria dos Anjos, onde o Papa recebeu simbolicamente o manto e o cajado do Peregrino.
O cajado foi entregue por Abrhaley, refugiado eritreu invisual, que chegou à Itália em 2018 graças à criação dos corredores humanitários, o qual conversou com o Papa durante alguns momentos.
Representantes do grupo de pessoas pobres e de quem trabalha junto delas apresentaram o seu testemunho, visivelmente emocionados.
Francisco agradeceu a “coragem e sinceridade” de todos os que falaram, elogiando a “esperança” e a capacidade de “resistir”, diante das dificuldades.
O discurso deixou uma referência particular à presença do cardeal Philippe Barbarin, elogiando a sua presença entre os pobres e o testemunho de “silêncio e oração” que deixou, durante o processo de que foi alvo, com a acusação de não ter denunciado abusos sexuais contra menores, na Arquidiocese de Lyon (França), da qual viria a ser absolvido.
A iniciativa foi organizada pelo Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização (Santa Sé), que destacou a presença de “um grupo de 500 pessoas pobres de diferentes partes da Europa”.
Após a intervenção de Francisco, decorreu um momento de oração, que inclui invocações inspiradas em reflexões de Santa Teresa de Calcutá e de São Francisco de Assis.
O Papa despediu-se com a oferta de presentes aos participantes, regressando depois ao Vaticano; o grupo foi recebido, para o almoço, pelo bispo de Assis, D. Domenico Sorrentino.
Este domingo, no V Dia Mundial dos Pobres, Francisco preside à Missa na Basílica de São Pedro, pelas 10h00 (menos uma em Lisboa), com a participação de 2 mil pessoas acompanhadas por diversas associações, no território de Roma.
O Papa alertou, esta manhã, para a “violência contra as mulheres” e a indiferença perante o sofrimento dos mais desfavorecidos.
Um dos testemunhos apresentados foi Farzaneh, mulher do Afeganistão, que evocou as jovens de Cabul “que hoje em dia não podem ir à universidade e escolher por si mesmas, comprar pão, ir ao padeiro ou divertir-se”. “Sou filha de xiitas. Agradeço à Igreja italiana por nos ajudar e salvar as nossas vidas”, acrescentou.
Abdul, refugiado iraquiano, também agradeceu pelo acolhimento da Cáritas e do governo italiano, com cujo exército tiveram oportunidade de trabalhar, no Médio Oriente.
“Estamos muito preocupados com uma parte da nossa família que ficou no Afeganistão e um filho refugiado na Turquia, gostaríamos de ter ajuda para salvá-los também”, referiu.