Tempo Comum - Ano B
LITURGIA DO TEMPO COMUM
Escrito por frei Lopes Morgado
mês de novembro
Este ano, ao coincidir o seu primeiro dia com o domingo,
iniciamos o mês com a Solenidade de Todos os Santos
e não com a liturgia do XXXI domingo do Tempo Comum.
Uma oportunidade para irmos fazendo o balanço da nossa vida cristã
neste ano litúrgico, perto do fim: qual a transformação operada em nós
pela escuta da Palavra de Deus e a comunhão do Corpo de Cristo
nas muitas Eucaristias vividas em comunidade?
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“O meu reino não é deste mundo”
22 de novembro
XXXIV DOMINGO COMUM
Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo
LEITURAS: 1ª: Dn 7,13-14. Salmo 93/92, 1ab.1c-2.5. R/ O Senhor é rei num trono de luz. 2ª: Ap 1,5-8. Evangelho: Jo 18,33b-37. Semana III do Saltério.
Neste domingo celebramos a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo, e encerramos o ano litúrgico do ciclo B. Mas não é Marcos quem apaga a vela, depois de nos ter acompanhado na maior parte dos domingos; é João, para nos recordar as palavras de Jesus a Pilatos: «O meu reino não é deste mundo… o meu reino não é daqui» (Jo 18-33b-37). Porém, como esse reino se constrói a partir daqui, continuamos a rezar: «Venha a nós o vosso reino»; e no próximo Domingo começaremos um novo ano litúrgico, para ver se finalmente conseguimos dar este nome à cidade: «O Senhor é a nossa justiça» (Jr 33,14-16: 1ª Leitura do I Domingo do Advento, Ano C).
O facto de Cristo nos dizer que o seu reino não é deste mundo, não nos permite pensar nem agir como se o mundo não fosse do seu reino e Cristo nada tivesse feito por ele ou nada tivesse a ver com ele. E muito menos cauciona a pretensão de eliminar do mundo qualquer presença e referência cristã, acantonando os cristãos nas igrejas e fechando a religião na sacristia como valor meramente museológico.
Para já, os cristãos vivem neste mundo. Não têm outro para atuar os seus dons e valores, nem outra terra para iluminar e salgar. Parece provado, e até já se vai vendo, que não faltam mundos como o nosso. Mas a Terra ainda tem várias razões que a distinguem: é povoada por seres humanos e inteligentes (embora, às vezes, desumanizados e pouco sensatos), foi este o mundo que Deus amou, foi pelos que nele habitam que o seu Filho morreu e ressuscitou, e é deste mundo que Ele é rei.
«Então, tu és Rei?», perguntou Pilatos. Jesus respondeu-lhe: «É como dizes: sou Rei. Para isso nasci e vim ao mundo, a fim de dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz» (Evangelho). Hoje celebramos esta soberania de Jesus, que, sendo nosso rei, «não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por todos» (Mc 10,45: ver XXIXX domingo comum-B).
Daniel viu-O como «alguém semelhante a um filho de homem», a quem foi «entregue o poder, a honra e a realeza, e todos os povos e nações O serviram. O seu poder é eterno, não passará jamais, e o seu reino não será destruído», pois Ele é Filho de Deus (1ª Leitura). Sim, «O Senhor é rei» (Salmo), «o Príncipe dos reis da terra» e «Senhor do universo» (2ª Leitura); mas, sendo Deus, fez-se um de nós (Fl 2,5-11). Ou seja: também o seu modo de reinar não é como o deste mundo, onde «aqueles que são considerados governantes das nações fazem sentir a sua autoridade sobre elas. […] Não deve ser assim entre vós» (Mc 10,42.43). Uma lição permanente para nós, como povo de reis, se quisermos instaurar os valores cristãos na ordem temporal, como devemos.
“Está próximo o verão”?
15 de novembro
XXXIII DOMINGO COMUM
Leituras: 1ª: Dn 12,1-3. Salmo 16/15,5. 8.9-10.11. R/ Defendei-me, Senhor: Vós sois o meu refúgio.2ª: Heb 10,11-14.18. Evangelho: Mc 13,24-32. Semana II do Saltério.
Ao aproximar-se a conclusão do ano litúrgico, a Igreja proclama textos apocalípticos do Antigo e do Novo Testamento. Com esta pedagogia, sugere aos fiéis que aproveitem os dias para uma revisão de vida ao tempo de graça que termina. Pois cada novo ano é uma oportunidade para a salvação, ganha ou perdida.
Na 1ª Leitura, Daniel anuncia a libertação do povo de Israel após os horrores praticados por Antíoco Epifânio. Mas, como hoje na Liturgia, em que temos no pensamento as vítimas de atentados terroristas exportados do Médio Oriente para a Europa, o seu texto extrapola da morte e ressurreição do país; fala da morte e ressurreição física e do julgamento sobre a vida, abrindo a fé à esperança da salvação: «Será um tempo de angústia […] Mas, nesse tempo, virá a salvação para o teu povo, para aqueles que estiverem inscritos no livro de Deus; acordarão, uns para a vida eterna, outros para a vergonha e o horror eterno.»
Jesus, no Evangelho, usa os rebentos da figueira que anunciam o verão, para falar da sua vinda. Ou seja, abre o livro universal da natureza, para nos introduzir no entendimento da sua palavra: «Então verão o Filho do Homem vir sobre as nuvens, com grande poder e glória.» Como Ele diz no Apocalipse: «Eis que Eu venho em breve e trarei a recompensa para retribuir a cada um confirme as suas obras» (Ap 22,12). E assim, no inverno da natureza ou da vida, somos levamos a perguntar-nos. “Está próximo o verão? O Senhor está à minha porta, para me chamar?” Como não sabemos o dia nem a hora, também não temos a resposta. Fiquemo-nos, então, pelo apelo à vigilância sobre a nossa vida humana e cristã. Sabendo que a morte não é um fim – é um recomeço da vida, como anunciam os rebentos após o letargo da figueira.
Daí a exortação de Jesus, segundo o Evangelho de S. Lucas 21,36: «Vigiai e orai em todo o tempo, para poderdes comparecer diante do Filho do Homem» (Aleluia).
Com o Salmista, oramos confiantes:
«Senhor,
está nas vossas mãos o meu destino.
O Senhor está sempre na minha presença,
com Ele a meu lado não vacilarei.
Por isso o meu coração se alegra e a minha alma exulta
e até o meu corpo descansa tranquilo.
Dar-me-eis a conhecer os caminhos da vida,
alegria plena em vossa presença,
delícias eternas à vossa direita.»
Na Escola das viúvas
08 de novembro
XXXII DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: 1 Rs 17,10-16. Salmo 146/ 145,7.8-9a.9bc-10. R/ Ó minha alma, louva o Senhor. 2ª: Heb 9,24-28. Evangelho: Mc 12,38-44. Semana I do Saltério. Primeiro dia da Semana dos Seminários.
Paulo disse aos Coríntios sobre a partilha de bens: «Não se trata de, ao aliviar os outros, vos fazer entrar em apuros, mas sim de que haja igualdade. No momento presente, o que vos sobra a vós supera a indigência dos outros, para que um dia o supérfluo deles compense a vossa indigência» (2 Cor 8,13).
Isto é o que normalmente acontece: dar o que nos sobra, para que, no caso de se reverterem as situações, os outros nos deem do que não lhes faz falta. Mas há quem dê tudo o que tem, confiante em que não lhe há de faltar o necessário. E não estou a falar dos que renunciam a tudo para seguir a Cristo num caminho de total consagração aos outros, e aderem a um Instituto religioso com o voto de pobreza, como evocamos neste Ano da Vida Consagrada. Nem aos que decidem entregar-se a Deus, o bem maior que preencha a sua vida no serviço dos outros como sacerdotes, objetivo da Semana dos Seminários, que hoje começa. Refiro-me ao testemunho dado por duas viúvas, na Palavra de hoje, que interpelam à partilha nesta hora de tantos dramas e tantas carências do mundo.
A 1ª Leitura fala de uma, em Sarepta, a quem restava apenas um pouco de farinha e azeite para cozer o último pão para ela e o seu filho… e depois morrer. Era o que ela se preparava para fazer, quando o profeta Elias chega e lhe pede água e pão. Ao saber da sua carência, diz-lhe: «faz como disseste. Mas primeiro coze um pãozinho e traz-mo aqui. Depois prepararás o resto para ti e teu filho.» Ela assim fez, «e comeram ele, ela e seu filho. E desde aquele dia, nem a panela de farinha se esgotou, nem se esvaziou a almotolia do azeite, como o Senhor prometera pela boca de Elias».
Porque «o Senhor faz justiça aos oprimidos,
dá pão aos que têm fome
… ampara o órfão e a viúva» (Salmo responsorial).
No Evangelho, «Jesus sentou-se em frente da arca do tesouro [do templo de Jerusalém] a observar como a multidão deitava o dinheiro na caixa. Muitos ricos deitavam quantias aviltadas. Veio uma pobre viúva e deitou duas pequenas moedas». Então, «Jesus chamou os discípulos e disse-lhes: “Esta pobre viúva deitou na caixa mais do que todos os outros. Eles deitaram do que lhes sobreva, mas ela, da sua pobreza, ofereceu tudo o que tinha, tudo o que possuía para viver.»
Isto é ter fé e confiança em Deus, a quem pertence o nosso futuro. A mesma fé de Abraão, disposto a renunciar ao seu futuro como pai de inúmera descendência (Gn 12,2; 13,16; 15, 5;17,5), sacrificando a Deus o seu único filho. Mas Deus apenas queria ver a sua disponibilidade para fazê-lo, por confiar n’Ele, como estas duas viúvas. E, vendo o modo como Deus levou a sua avante, poupando-lhe Isaac, «Abraão chamou àquele lugar “O Senhor providenciará”» (Gn 22).
Na solução das nossas desigualdades e carências, e no alívio de tantos refugiados entregues à sua sorte por exploradores do sofrimento alheio, também temos visto a força da partilha e da solidariedade dos mais pobres. Temos de conceder mais oportunidades à providência de Deus, partilhando o que Ele nos deu quando os outros precisam mais do que nós. Pois, se um problema gera outro problema, uma solução faz surgir novas soluções – mais eficazes do que julgamos, porque nascidas da criatividade generosa e não apenas da programação calculista de riscos e benefícios. Dar aos pobres é sempre emprestar a Deus. E Ele nunca nos fica a dever nada.
“… VI SURGIR NUMEROSA MULTIDÃO…”
01 de novembro
TODOS OS SANTOS (Solenidade)
LEITURAS:1ª: Ap 7,2-4.9-14. Salmo24 (23),1-2.3-4ab.5-6. R/ Esta é a geração dos que procuram o Senhor. 2ª: 1 Jo 3,1-3. Evangelho: Mc 5,1-12a. Semana III do Saltério.
Ao celebrarmos TODOS OS SANTOS, é sempre a santidade de Deus que celebramos. «Vós, Senhor, sois verdadeiramente santo. Sois a fonte de toda a santidade!» - proclamamos no início da II Anáfora Eucarística, logo a seguir ao Prefácio. E «pela Liturgia da terra – como afirmou o Concílio Vaticano II em 4 de dezembro de 1963 – participamos, saboreando-a já, na celeste Liturgia celebrada na cidade santa de Jerusalém, para a qual nos encaminhamos como peregrinos e onde Cristo está sentado à direita de Deus, ministro do santuário e do verdadeiro tabernáculo: por meio dela cantamos ao Senhor um hino de glória com toda a milícia do exército celeste, esperamos ter parte e comunhão com os Santos cuja memória veneramos e aguardamos como Salvador nosso Senhor Jesus Cristo, até Ele aparecer como nossa vida e nós aparecermos com Ele na glória» (Constituição sobre a Sagrada Liturgia, nº 8).
Por isso o Apocalipse, revelado a João «no dia do Senhor» (1,10), é escolhido como Primeira Leitura de hoje. Nela, o vidente de Patmos apresenta uma ação litúrgica no céu. Primeiro, OUVE «o número dos servos do nosso Deus que foram marcados na fronte: cento e quarenta e quatro mil, de todas as tribos dos povos de Israel.» Em nota de rodapé ao v. 4 do texto desta Leitura, a “Bíblia Sagrada” da Difusora Bíblica diz: «Cento e quarenta a quatro mil. Trata-se de um número simbólico feito, por sua vez, com números sagrados e de totalidade: 4x12x1.000. O número 12 é o número do povo de Deus: 12 tribos. Este número indica a totalidade do novo povo de Deus resgatado por Cristo: 12 mil de cada uma das 12 tribos.» Ou seja: o chamamento de todos os cristãos à santidade.
Depois de ouvir o número dos eleitos, João VÊ «uma imensa multidão, que ninguém podia contar, de todas as nações, tribos, povos e línguas. Estavam de pé, diante do trono de Deus e na presença do Cordeiro, vestidos de túnicas brancas e palmas na mão. E clamavam em alta voz: «A salvação ao nosso Deus, que está sentado no trono, e ao Cordeiro.» E «um dos Anciãos («um dos servos viventes», diz a Bíblia da Difusora) tomou a palavra e disse-lhe: «Estes são os que vieram da grande tribulação, os que lavaram as túnicas e as branquearam no sangue do Cordeiro.»
O Refrão do Salmo Responsorial transpõe-nos da liturgia celeste para a nossa liturgia de peregrinos do céu, dizendo: «Esta é a geração dos que procuram o Senhor.» E com isto, diz-nos que a santidade é um desejo de Deus e uma procura e seguimento pelo caminho de Cristo e o testemunho dos santos, até chegar até Ele. O salmo 24(23), um “salmo processional”, diz «quem poderá subir à montanha do Senhor», até habitar no seu santuário, como dizia o texto do Concílio: «quem tem as mãos inocentes e o «coração puro», e «quem não invocou o seu nome em vão».
Na Segunda Leitura, o apóstolo João (diferente do João do Apocalipse) canta o «admirável amor que o Pai nos consagrou em nos chamar filhos de Deus. E somo-lo de facto» – sublinha. Desta qualidade de filhos deriva, por um lado, que «seremos semelhantes a Deus, porque O veremos tal como Ele é»; e por outro, a necessidade de «todo aquele que tem esta esperança se purificar a si mesmo, para ser puro como Ele é puro». Ou seja: ao amor de Pai, correspondermos com amor de filho; e ao privilégio de filho, preocuparmo-nos em nos parecermos com o Pai. Isto é, de nos alistarmos na geração dos que O procuram.
O Evangelho é uma explicitação da 1ª Leitura, quanto à universalidade dos chamados a ser “felizes”, “bem-aventurados” ou “santos”, e à sua diversidade: pobres em espírito, humildes, sofredores, com fome e sede de justiça, misericordiosos, puros de coração, promotores da paz, perseguidos por amor da justiça, insultados por causa do nome de Jesus. Nenhum santo esgota a lista, como nenhum comensal come todos os pratos de uma carta de restaurante. Mas, o esforço por vencer um vício, fará eliminar outros; e quem seguir uma virtude, levará outras consigo, como acontece com as cerejas.
Atenção: no caminho da santidade, o principal agente não somos nós. Apesar do amor e do esforço que nos são pedidos, tudo é pura graça de Deus. Então, «caríssimos: Vede que admirável amor o Pai nos consagrou» e sigamos o Filho, pelo Espírito, não vivendo como escravos. Nos momentos difíceis, não nos faltará o Mestre, como no Aleluia antes do Evangelho de hoje: «Vinde a Mim, vós todos que andais cansados e oprimidos, e Eu vos aliviarei.»
outubro
Do XXVII ao XXX domingo comum
Escrito por frei Lopes Morgado
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O HOMEM, A MULHER E A FAMÍLIA
04 de outubro
XXVII DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Gn 2,18-24. Salmo 128/127, 1-2.3.4-5.6 R/ O Senhor nos abençoe em toda a nossa vida. 2ª: Heb 2,9-11. Evangelho: Mc 10,2-16. Semana III do Saltério.
Os textos de hoje convidam a refletir sobre a família em geral e a família de cada um, confrontando o sonho das origens com a realidade da vida. A 1ª Leitura apresenta o projeto do Criador, na 2ª versão bíblica das origens, onde o ser humano surge no topo da obra de Deus e responsável por ela, como na 1ª versão, pois é ele que lhes impõe o nome.
Em forma poética, diz-nos: Deus fez o homem como ser de relação, para dialogar e partilhar a vida com alguém: «Não é bom que o homem esteja só.» Esse alguém deve ser da sua espécie e natureza: entre todos os animais e aves, «não encontrou uma auxiliar semelhante a ele»; por isso Deus a forma de uma costela do homem, para dizer que é da sua espécie e tem a mesma dignidade, mas não é do mesmo género, ao contrário do que hoje se pretende impor. Como a Bíblia já dissera na 1ª versão da criação, «Ele os criou homem e mulher» (Gn 1,27).
«Por isso, o homem deixará pai e mãe para se unir à sua esposa, e os dois serão uma só carne». O texto supõe que de modo exclusivo e definitivo. Assim o interpretou Cristo, à pergunta dos fariseus: «Pode um homem repudiar a sua mulher?» Disse: «não separe o homem o que Deus uniu.» E acrescentou: «Quem repudiar a sua mulher e casar com outra, comete adultério com a primeira. E se a mulher repudiar o seu marido e casar com outro, comete adultério.»
A solução está no amor, diz o verso do Aleluia. E o Salmo canta uma família: marido ganhando o sustento com o seu trabalho, esposa «como videira fecunda» e «filhos como ramos de oliveira,/ ao redor da tua mesa».
O ESPÍRITO DE SABEDORIA
11 de outubro
XXVIII DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Sb 7,7-11. Salmo 90/89,12-13.14-15.16-17. R/ Enchei-nos, Senhor, da vossa misericórdia: será ela a nossa alegria. 2ª: Heb 4,12-13. Evangelho: Mc 10,17-30. Semana IV do Saltério.
O «homem» do Evangelho (e não falemos do «jovem» rico, todos os anos, pois só Mateus é que fala de um «jovem»!) não teve «o espírito de sabedoria». E ele até começou muito bem: aproximou-se de Jesus a correr, ajoelhou-se diante d´Ele e perguntou-lhe com muito boa intenção: «Bom Mestre, que hei de fazer para alcançar a vida eterna?» E até cumpria todos os mandamentos «desde a juventude» (por isso, já não era um jovem…).
Só não teve «o espírito de sabedoria», porque o sábio a quem ela foi concedida
«preferiu-a «aos cetros e aos tronos
e, em sua comparação, considerou a riqueza como nada
(…) pois todo o ouro, à vista dela, não passa de um pouco de areia
e, comparada com ela, a prata é considerada como lodo»» (1ª Leitura).
Ele, ouvindo o convite de Jesus a dar tudo aos pobres e segui-lo, para ter um tesouro do Céu, «retirou-se pesaroso, porque era muito rico». E assim, ao não querer arriscar nada para garantir o que desejava, pôs em risco a vida eterna que inicialmente pretendia alcançar: «Como sé difícil para os que têm riquezas entrar no reino de Deus!» E, com essa incapacidade para avaliar as coisas, talvez nem tenha tirado grande partido da sua riqueza.
No Salmo pedimos: Senhor, «ensinai-nos a contar os nossos dias.»
Quantos teria ainda aquele homem, para perder a oportunidade do negócio da sua vida – ser discípulo de Jesus?!
«A palavra de Deus é viva e eficaz, (…)
é capaz de discernir os pensamentos e intenções do coração» (2ª Leitura).
Deixemo-la discernir em nós o que melhor convém à nossa vida.
“PARA SERVIR E DAR A VIDA”
18 de outubro
XXIX DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Is 53,10-11. Salmo 33/32,4-5.18-19.20.21. R/ Desça sobre nós a vossa misericórdia, porque em Vos esperamos, Senhor. 2ª: Heb 4,14-16. Evangelho: Mc 10,35-45. Semana I do Saltério. DIA MUNDIAL DAS MISSÕES.
Voltamos à ideia central do domingo passado: a arte de saber investir a vida para ganhá-la. A 1ª Leitura dá-nos apenas dois versículos do IV Cântico do Servo, sobre Paixão e Glória, mas neles temos a síntese de toda a mensagem: o Senhor quis «esmagar o seu Servo pelo sofrimento», porque é fonte de vida e sabe que faz parte da vida morrer para dar fruto. Não é por sadismo. Daí o sofrimento não ser imposto: só vale «se o Servo anónimo oferecer a sua vida como vítima de expiação»; nesse caso, «terá uma descendência duradoira, viverá longos dias, e a obra do Senhor prosperará em suas mãos. Terminados os sofrimentos, verá a luz e ficará saciado.» E, deste modo, «pela sua sabedoria, o Justo, meu Servo, justificará a muitos e tomará sobre si as suas iniquidades». Ao servir, dá a vida e dá vida. «Na verdade, quem quiser salvar a sua vida, há de perdê-la; mas, quem perder a sua vida por causa de mim e do Evangelho, há de salvá-la» (Mc 8,35).
Eis porque o rico do domingo passado fez um mau negócio. Como poderá suceder-nos, se nos quisermos salvar apenas a nós; este Dia Mundial das Missões lembra-nos que devemos procurar fazê-lo preocupando-nos com a salvação dos outros. Foi o que fez São Lucas, o evangelista deste ano, que hoje celebramos: deixando o conforto da sua comunidade, juntou-se a Paulo na evangelização, manteve-se fielmente junto dele, e pelo seu testemunho ganhou a confiança da Igreja que o promoveu de discípulo a evangelista com especial atenção aos pagãos, aos pecadores e aos mais desfavorecidos ou marginalizados, como os doentes, os pecadores e as mulheres.
A profecia do Cântico do Servo cumpre-se em Jesus – o Messias-Mestre que nos salvou pelo sofrimento. Por isso, no Evangelho, Ele desafia «Tiago e João, filhos de Zebedeu», a beber o cálice da sua Paixão para obterem, pelo “serviço”, os dois lugares de honra na sua glória, que pretendiam obter por “cunha” ou “favor”: «quem entre vós quiser tornar-se grande, será vosso servo, e quem quiser entre vós ser o primeiro, será escravo de todos; porque o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida pela redenção de todos» (Evangelho). Esta última frase, em que Jesus se propõe como modelo de serviço, é a que a Liturgia seleciona para o refrão do Aleluia.
«Permaneçamos firmes na profissão da nossa fé» - exorta o autor da Carta aos Hebreus (2ª Leitura), lembrando que temos nos Céus um sumo-sacerdote, «Jesus Cristo, Filho de Deus», que passou por toda a provação, exceto a do pecado. «Vamos, portanto, cheios de confiança ao trona da graça, a fim de alcançamos misericórdia e obtermos a graça de um auxílio oportuno».
Apoiados nesta confiança, rezamos o refrão do Salmo Responsorial:
«Desça sobre nós a vossa misericórdia,
porque em Vós esperamos, Senhor.»
E proclamamos, com o Salmista:
«A nossa alma espera o Senhor:
Ele é o nosso amparo e protetor.»
“EU SOU UM PAI PARA ISRAEL”
25 de outubro
XXX DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: J 31,7-9. Salmo 126/125,1-2ab.2cd-3.4-5.6. R/ O Senhor fez maravilhas em favor do seu povo. 2ª: Heb 5,1-6. Evangelho: Mc 10,46-52. Semana II do Saltério.
O título deste comentário é da 1ª Leitura, que diz: «O Senhor salvou o seu povo, o resto de Israel.» Nela, o profeta Jeremias descreve antecipadamente o regresso à pátria dos exilados em Babilónia, exortando: «Soltai brados de alegria.» O texto é belo e comovente, ultrapassando a realidade:
«Vou trazê-los das terras do Norte
e reuni-los dos confins do mundo.
Entre eles vêm o cego e o coxo
a mulher que vai ser mãe e a que já deu à luz.
É uma grande multidão que regressa.
Eles partiram com lágrimas nos olhos
e Eu vou trazê-los no meio de consolações.»
Diria que o grande regresso/êxodo deste povo ainda não terminou; mas hoje tem outros contornos.
O Salmo confirma: «O Senhor fez maravilhas em favor do seu povo.» Evoca o mesmo regresso dos cativos de Sião, que fazia exclamar os pagãos: «O Senhor fez por eles grandes coisas.» E dá confiança a todos os expatriados:
«À ida vão a chorar,
levando as sementes;
à volta vêm a cantar,
trazendo os molhos de espigas.»
Temos que ler e rezar mais os salmos que, não apenas na Liturgia, fazem a ponte entre o Antigo Testamento, o Novo e a vida.
Deus diz-nos, cada dia, o que diz de seu Filho Jesus: «Tu és meu filho, Eu hoje te gerei» (2ª Leitura). Ser pai é isso. E não apenas gerar de uma vez, porque nós estamos – ou devemos estar – sempre a nascer de novo. Por isso Ele é, também para nós, um Pai.
Jesus cura um cego: «Vai, a tua fé te salvou» (Evangelho). E ele segue-o, feliz. Uma lição para os Apóstolos, que o seguiam «assombrados e temerosos» (Mc 10,32).
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LITURGIA DO TEMPO COMUM
setembro
Do XXIII ao XXVI domingo comum
Escrito por frei Lopes Morgado
Em setembro regressamos ao Evangelho de Marcos,
para acompanhar Jesus por Tiro, Sídon e a Decápole (cap. 7-9),
antes de iniciar a sua subida para Jerusalém.
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OUVIR JESUS PARA TESTEMUNHÁ-LO
06 de setembro
XXIII DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Is 35,4-7a. Salmo 146(145) 7.8-9a.9bc-10. R/ Ó minha alma, louva o Senhor. 2ª:Tg 2,1-5. Evangelho: Mc 7,31-37. Semana III do Saltério.
Emociona escutar, neste duro tempo da vida, um oportuno texto do Advento: «Tende coragem, não temais. Aí está o vosso Deus… Ele próprio vem salvar-nos» (1ª Leitura).
O Salmo especifica várias salvações de Deus:
faz justiça aos oprimidos,
dá pão aos que têm fome
e a liberdade aos cativos.
… ilumina os olhos dos cegos,
levanta os abatidos,
ama os justos.
protege os peregrinos,
ampara o órfão e a viúva
e entrava o caminho aos pecadores.»
E o Evangelho mostra Jesus a curar «um surdo que mal podia falar», dizendo o resultado imediato desse gesto de salvação do homem todo: «Imediatamente se abriram os olhos do homem, soltou-se-lhe a prisão da língua e começou a falar corretamente.»
Sabemos que a fala é condicionada pela audição. O texto diz-nos, assim, que, para anunciar o Evangelho, primeiro é preciso, como este homem, abrir os ouvidos e escutar a palavra de Deus. No Batismo, o ministro atualiza o gesto de Jesus; estendendo a mão direita sobre o neófito, diz: «O Senhor Jesus, que fez ouvir os surdos e falar os mudos, te dê a graça de, em breve, poderes ouvir a sua palavra e professar a fé, para louvor e glória de Deus Pai.»
Quantos pais e padrinhos, depois de assumirem isto em relação às crianças, se preocupam com que elas escutem a palavra que leva à profissão da fé na vida adulta, para louvar e dar glória a Deus?
«Jesus pregava o Evangelho do reino e curava todas as enfermidades entre o povo» (Aleluia). Ontem, hoje e sempre, evangelizar é isto: atender ao espírito e ao corpo.
A FÉ E AS OBRAS
13 de setembro
XXIV DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Is 50,5-9a. Salmo 116(114), 1-2.3-4.5-6.8-9. R/ Andarei na presença do Senhor, sobre aterra dos vivos. 2ª: Tg 2,14-18. Evangelho: Mc 8,27-35. Semana IV do Saltério.
O Evangelho de hoje é o ponto alto da 1ª parte de Marcos; o outro já foi atingido no domingo de Ramos (Mc 15,39). Após três anos a revelar os mistérios do Reino aos seus discípulos, Jesus faz-lhes aqui uma espécie de exame de profissão de fé: «Quem dizem os homens que Eu sou?... E vós, quem dizeis que Eu sou?»
Pedro responde: «Tu és o Messias!» E a sua resposta diz-nos que não basta sabermos o que os outros sabem ou dizem de Jesus; temos de estar preparados para testemunhar a nossa fé cristã em privado ou em público. Jesus não quis que os discípulos o dissessem a ninguém, antes de o viverem e estarem preparados para o testemunho na provação. Pedro mostrou que não estava, ao repreender Jesus quando Ele lhes anunciou a Paixão; e Jesus, que não tinha elogiado o testemunho de Pedro, como é feito em Mateus 16,17-19, vai chamar-lhe «Satanás» (Mc 8,27-35).
«Toda a minha glória está na cruz do Senhor», dizia Paulo (Aleluia).
O discípulo da 1ª Leitura estava preparado: apresentou-se, não resistiu nem recuou, confiou no Senhor.
Mas, «de que serve a alguém dizer que tem fé, se não tem obras? Poderá essa fé obter-lhe a salvação? Se um irmão ou irmã não tiverem que vestir e lhes faltar o alimento de cada dia, e um de vós lhe disser: “Ide em paz. Aquecei-vos e saciai-vos”, sem lhes dar o necessário para o corpo, de que lhes servem as vossas palavras? Assim também a fé sem obras está completamente morta» (2ª Leitura).
Pensamos nisto, ao preparar o “ano da fé” e falar de “nova evangelização”?
CONDIÇÕES PARA SEGUIR JESUS
20 de setembro
XXV DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Sab 2,12.17-20. Salmo 54(53), 3-4.5.6.8. R/ O Senhor sustenta a minha vida. 2ª: Tg 3,16–4,3. Evangelho: Mc 9,30-37. Semana I do Saltério.
Em Marcos, após a interpelação a Pedro, no domingo passado, Jesus diz a quem o quiser seguir: «Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me» (8,34). Depois vem o episódio da Transfiguração (Evangelho de 6 de agosto). E no Evangelho deste domingo, Jesus anuncia pela segunda vez a sua próxima Paixão: «O Filho do Homem vai ser entregue às mãos dos homens e eles vão matá-lo; mas Ele, três dias depois de morto, ressuscitará.»
O evangelista diz que «os discípulos não compreendiam aquelas palavras e tinham medo de o interrogar»; e é chocante saber que, por isso, em vez de tentarem esclarecer a sua vocação e missão junto de Jesus, se puseram a discutir «uns com os outros sobre qual deles era o maior». Ou seja, estavam a garantir o seu futuro, indiferentes à sorte do Mestre. Daí, Jesus: «Quem quiser ser o primeiro será o último de todos e o servo de todos.»
Neste ponto, já podemos estabelecer um ideário para o discípulo de Jesus:
- deixar tudo e segui-lo;
- escutar a sua palavra de vida eterna;
- professar a fé nele;
- tomar a sua cruz até ao fim;
- servir, em vez de ser servido;
- acolher os pequeninos em seu nome.
As ameaças dos ímpios na 1ª Leitura fazem olhar para Jesus, “Servo de Javé”, que já celebrámos na Semana Santa.
Por sua vez, o Salmo revela-nos a sua confiança e a de todos os justos: «Deus vem em meu auxílio.»
“Quem não é contra nós, é por nós”
27 de setembro
XXVI DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Nm 11,25-29. Salmo 19(18),8.10.12-13.14. R/ Os preceitos do Senhor alegram o coração. 2ª: Tg 5,1-6. Evangelho: Mc 9,38-43.45.47-48. Semana I do Saltério.
O Senhor dá o seu Espírito a quem quer, quando quer e como quer (Jo 3,8); e não há grupo ou igreja que se possa arrogar de o possuir em exclusivo.
Foi esta a lição que um jovem ouviu de Moisés, quando lhe foi dizer que dois homens, Eldad e Medad, inscritos entre os setenta anciãos escolhidos por Moisés para colaborar com ele, mas não estavam dentro da tenda quando o Espírito de Moisés desceu sobre os outros, também tinham recebido o mesmo Espírito e estavam a profetizar como eles. Ao jovem, que lhe dizia: «Moisés, meu senhor, proíbe-lhes», Moisés respondeu: «Estás com ciúmes por causa de mim? Que, dera que todo o povo do Senhor fosse profeta e que o Senhor infundisse o seu Espírito sobre eles» (1ª Leitura).
Há mais escolhidos e amados por Deus, que o servem a seu modo, mesmo que modo visível ou oficial não estejam com o grupo dos seus seguidores na hora da ação. Também foi esta a lição que o apóstolo João aprendeu, quando «disse a Jesus: “Mestre, nós vimos um homem a expulsar demónios em teu nome e procurámos impedir-lho, porque ele não anda connosco.” Jesus respondeu: “Não o proibais; porque ninguém pode fazer um milagre em meu nome e depois dizer mal de Mim. Quem não é contra nós é por nós”» (Evangelho).
Só Deus nos conhece a todos por dentro, e sabe quem está mais dentro ou mais fora, mais perto ou mais longe dele e do seu Espírito. Aos que conhecem ou presumem conhecer as exigências da sua palavra, como as de Jesus no Evangelho de hoje, compete-nos segui-las sem julgar nem afastar ninguém, embora nos sintamos comprometidos com todos. Sabendo que, se as exigências de vida são grandes, «os preceitos do Senhor alegram o coração». Porque
«A lei do Senhor é perfeita,
ela reconforta a alma.
As ordens do Senhor são firmes,
dão a sabedoria aos simples.
O temor do Senhor é puro
e permanece eternamente;
os juízos do Senhor são verdadeiros,
todos eles são retos. (Salmo Responsorial)
Peçamos, com o refrão do Aleluia:
«A vossa palavra, Senhor, é a verdade;
santificai-nos na verdade.»
À luz desta palavra, vê-se melhor a dureza da Carta de Tiago,
- recriminando os que têm riquezas acumuladas a apodrecer;
- os que negam o salário aos trabalhadores
e são insensíveis a esta injustiça de bradar aos céus;
- os que levam «uma vida regalada e libertina»,
condenando e matando o justo que não lhes pode resistir (2ª Leitura).
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LITURGIA DO TEMPO COMUM
agosto
Do XVIII ao XXII domingo comum
Escrito por frei Lopes Morgado
Nos domingos do mês de agosto concluímos a leitura
do capítulo VI do Evangelho de João sobre o Pão da Vida,
iniciado no último domingo de julho
e regressaremos ao Evangelho de Marcos
para acompanhar Jesus por Tiro, Sídon e a Decápole (cap. 7-9),
antes de iniciar a sua subida para Jerusalém.
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“Eu sou o pão da vida”
02 de agosto
XVIII DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Ex 16,2-4.12-15. Salmo 78(77), 3 e 4bc.23-24,25 e 54. R/ O Senhor deu-lhes o pão do céu. 2ª: Ef 4,17.20-24. Evangelho: Jo 6,24-35. Semana II do Saltério.
O Evangelho deste domingo já decorre no dia seguinte ao do milagre da multiplicação dos pães relatado no domingo passado. Jesus nota que a multidão continua a procurá-lo, mas por interesse material; e interpela-a: «Trabalhai, não tanto pela comida que se perde, mas pelo alimento que dura até à vida eterna e que o Filho do Homem vos dará.»
Por sua vez, a multidão evoca o milagre do maná que Moisés fez no deserto, e desafia Jesus a fazer um semelhante, para acreditarem n’Ele. O relato desse acontecimento constitui o texto da 1ª Leitura.
Aparentemente, a multidão não entendera a multiplicação dos pães como um milagre de Jesus, para lhe perguntarem que milagres fazia Ele. Tal como «toda a comunidade dos filhos de Israel», na 1ª Leitura, não tinha apreciado a sua libertação do Egito, para se considerar enjeitada por Deus no deserto; a satisfação da barriga cheia tinha-os nivelado aos animais, levando-os a perder o sentido da sua dignidade humana. Nunca os libertadores ou salvadores podem esperar a gratidão do povo nem o reconhecimento da história. E Jesus, que no domingo anterior não tinha querido ser aclamado rei, também não vai agora exibir o seu poder. Ele viera para revelar o rosto e a vontade do Pai; por isso, como bom pedagogo da fé, desvia a atenção das suas obras para «as obras de Deus» que eles devem praticar.
Num paciente diálogo catequético, Jesus diz-lhes que não foi Moisés quem lhes deu o maná ou «o pão do Céu», mas Deus; e Deus acaba de lhes enviar agora «o verdadeiro pão do Céu»; pois «o pão de Deus é o que desce do Céu [o próprio Jesus, Filho de Deus encarnado] para dar a vida ao mundo». A multidão, manifestando o lado “interesseiro” denunciado por Jesus, pede-lhe: «Senhor, dá-nos sempre desse pão.» E Jesus responde: «Eu sou o pão da vida: quem vem a Mim nunca mais terá fome, quem acredita em Mim nunca mais terá sede.»
Esta pedagogia de Jesus é uma caraterística do Evangelho de João, em que o Mestre dialoga com os seus interlocutores: Nicodemos (cap.3), a Samaritana (cap.4), a mulher surpreendida em adultério (cap.8), o cego de nascença (cap.9), Marta, irmã de Lázaro e Maria (cap.11). De alguma forma, João complementa Marcos, respondendo às interrogações que, no Evangelho deste, as pessoas levantam perante a figura de Jesus, envolta em “mistério”.
O Salmo supõe uma boa catequese familiar, baseada nas ações de Deus em favor do seu povo, que os pais bem podem aproveitar para fazer com os filhos neste dias de maior presença e convivência; pois as crianças e adolescentes são mais sensíveis a estes sinais experimentados na vida, como via da fé para descobrir e crer em Deus, do que à “doutrina” teórica “aprendida” na Catequese. Diz o Salmista:
«Nós ouvimos e aprendemos,
os nossos pais nos contaram
os louvores do Senhor e o seu poder
e as maravilhas que Ele realizou.
(…) para alimento fez chover o maná,
deu-lhes o pão do céu.»
E o refrão, tomado deste último versículo, reforça a ponte entre o Antigo e o Novo Testamento, entre a figura do maná e a realidade do pão eucarístico: «O Senhor deu-lhes o pão do céu.»
“Levanta-te e come”
09 de agosto
XIX DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: 1 Rs 19,4-8. Salmo 34(33),2-3.4--5.6-7.8-9. R/ Saboreai e vede como o Senhor é bom. 2ª: Ef 4,30–5,2. Evangelho: Jo 6,41-51. Semana III do Saltério.
O Evangelho começa com uma reação dos judeus igual às dos conterrâneos de Jesus que vimos no Domingo XIV, a propósito de Ele ter dito, no texto anterior, que era o verdadeiro Pão descido do Céu. Os judeus terão pensado e murmurado: “Se nós conhecemos a sua família, como é que Ele diz que desceu do Céu?!” E, muito ao jeito das catequeses dialogadas em João, que referi no domingo passado, Jesus responde-lhes, reafirmando o mesmo frontalmente: «Eu sou o pão vivo que desceu do Céu. Quem comer deste pão viverá eternamente. E o pão que Eu hei de dar é a minha carne pela vida do mundo.»
Na 1ª Leitura, o profeta Elias, cansado de andar um dia inteiro a percorrer o deserto e a subir o Monte Horeb, sentou-se à sombra de um junípero e pediu a Deus que lhe tirasse a vida; e, deitando-se, adormeceu. Um Anjo do Senhor despertou-o e mandou-o comer e beber do pão e da água que lhe trouxera; ele assim fez, mas voltou a adormecer. O Anjo insistiu com ele segunda vez, e «Elias levantou-se, comeu e bebeu. Depois, fortalecido com aquele alimento, caminhou durante quarenta dias e quarenta noites até ao monte de Deus, Horeb.»
Renovando e personalizando num profeta famoso de Israel o que tinha acontecido séculos antes com todo o povo, o texto vem reforçar as palavras de Jesus, estimulando-nos a comungar o seu Corpo e Sangue de forma habitual como condição de garantirmos a força necessária para o seguir até ao fim. «Saboreai e vede como o Senhor é bom», exorta-nos o refrão do Salmo. Quem comunga, sabe que sim.
“Vede como procedeis”
16 de agosto
XX DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Pr 9,1-6. Salmo 34(33),2-3.10-11.12-13.14-15. R/ Saboreai e vede como o Senhor é bom. 2ª: Ef 5,15-20. Evangelho: Jo 6,51-58. Semana IV do Saltério.
A 1ª Leitura faz-nos o convite da Sabedoria, para o seu banquete: «Vinde comer do meu pão e beber do meu vinho que vos preparei. Deixei a insensatez e vivereis; segui o caminho da prudência.»
E no Evangelho, Jesus renova o apelo à comunhão do seu Corpo e Sangue: «Em verdade, em verdade vos digo: Se não comerdes a carne do Filho do homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna; e Eu o ressuscitarei no último dia.»
O Salmo responsorial repete o mesmo refrão do domingo passado e há de voltar a repeti-lo no próximo: «Saboreai e vede como o Senhor é bom.» Talvez isso nos deva merecer alguma atenção. Pois não basta saborear o Pão da eucaristia e ficar a saber ou dizer que o Senhor é bom; é preciso viver em união com o Senhor que se comungou e em comunhão com todas as pessoas. Daí o Salmista apontar para vida:
«A toda a hora bendirei o Senhor,
o seu louvor estará sempre na minha boca.
A minha alma gloria-se no Senhor:
escutem e alegrem-se os humildes. (…)
Guarda do mal a tua língua
e da mentira os teus lábios.
Evita o mal e faz o bem,
procura a paz e segue-a.»
Na 2ª Leitura, Paulo acompanha o Salmo: «Vede como procedeis. Não vivais como insensatos, mas como pessoas inteligentes. Aproveitai bem o tempo, porque os dias que correm são maus. Por isso, não sejais irrefletidos.»
E, como que num ritornello que tudo rememora e relança, o verso do Aleluia volta à palavra de Jesus: «Quem come a minha carne e bebe o meu Sangue/ permanece em mim e Eu nele, diz o Senhor.» Que mais precisamos de ouvir e saber, para reAGIRMOS de maneira diferente dos judeus ouvintes de Jesus, que «discutiam entre si» em vez de acolherem a palavra do Mestre e aderirem a Ele pela fé? O que Jesus diz neste Evangelho tem a ver com ganhar ou perder a nossa vida. Faremos bem em lê-lo várias vezes.
“Nós acreditamos e sabemos”
23 de agosto
XXI DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Js 24,1-2a.15-17.18b. Salmo 34(33),2-3.16-17.18-19.20-21.22-23. R/ Saboreai e vede como o Senhor é bom. 2ª: Ef 5,21-32. Evangelho: Jo 6,60-69. Semana I do Saltério.
Após o longo diálogo entre os judeus e Jesus, ao jeito de S. João, vem a separação das águas pela rejeição ou o acolhimento da Palavra. Domingo passado, os judeus ficaram a discutir entre si: «Como pode Ele dar-nos a sua carne a comer?» A pensar nas suas razões, não ouviram a resposta de Jesus. Por isso, hoje, escandalizados com a afirmação de que tinham de comer a sua carne e beber o seu sangue, «muitos discípulos afastaram-se e já não andavam com Ele». Jesus apenas tinha convidado alguns a segui-lo, não obrigando ninguém a fazê-lo. Por isso, desafia os que tinham ficado com Ele, pois não queria seguidismos ambíguos nem interesseiros: «Também vós quereis ir embora? Respondeu-lhe Simão Pedro: “Para quem havemos de ir, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna. Nós acreditamos e sabemos que Tu és o Santo de Deus.»
E nós? Porque ficámos e continuamos com Ele? Em quem – ou em que – acreditamos?
Procuramos esclarecer as nossas razoáveis dúvidas humanas com a sua Palavra de Deus?
À profissão de fé de Pedro, em nome dos Apóstolos, corresponde a de Josué na 1ª Leitura. Convocando os responsáveis e o povo numa assembleia em Siquém, desafia-os a optar de vez pelos deuses pagãos, a quem os seus pais tinham servido, ou pelo Senhor. E diz: «Eu e a minha família serviremos o Senhor.» Estimulado pelo seu testemunho, o povo respondeu: «Também nós queremos servir o Senhor, porque Ele é o nosso Deus.»
E nós? A quem queremos servir? Porquê?
Do Evangelho, fiquem as palavras de Jesus que motivaram a decisão de Pedro: «As palavras que Eu disse são espírito e vida. Mas, entre vós, há alguns que não acreditam.» Para a história da Aliança continuar, é preciso que nós, na Eucaristia de hoje, renovemos uma vez mais a nossa fé, mas atualizada pela escuta e a aceitação da Palavra de Deus.
“… pela palavra da verdade”
30 de agosto
XXII DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Dt 4,1-2.6-8. Salmo 15(14),2-3a.3cd-4ab.4c-5. R/ Quem habitará, Senhor, no vosso santuário? 2ª: Tg 1,17-18.21b-22.27. Evangelho: Mc 7,1-8.14-15.21-23. Semana II do Saltério.
Voltamos ao Evangelho de Marcos. E defrontamo-nos com um tema sempre antigo e sempre novo: a questão da pureza. Havia leis do Antigo Testamento sobre alimentos a não comer, contactos com certos doentes a evitar, lavagens a fazer… como condição para entrar no templo. Tudo para criar no povo eleito, através de sinais físicos, a consciência de que devia ser santo porque o seu Deus era santo.
Convém não confundir. Os filhos de Israel receberam «os mandamentos do Senhor» seu Deus, com ordem expressa de os cumprir e pôr em prática, sem acrescentar nem suprimir nada; tal observância ia dar-lhes «sabedoria e prudência aos olhos dos povos, que, ao ouvirem falar de todas estas leis», reconheceriam que Deus lhes dera «mandamentos e decretos tão justos» (1ª Leitura).
Mas os judeus acrescentarem-lhes inúmeros preceitos humanos, confundindo impureza legal com impureza moral. Jesus revela a plenitude do sentido da Lei: ter uma vida limpa não é lavar as mãos, a roupa e os pratos, evitar os leprosos e outros doentes contagiosos; é purificar o interior do coração, pois daí é que sai tudo aquilo que nos torna impuros.
É essa a «palavra da verdade», pela qual o Pai nos gerou em Cristo (2ª Leitura).
O Salmo insiste nesse caminho:
«O que vive sem mancha e pratica a justiça
e diz a verdade que tem no coração
e guarda a língua da calúnia.
O que não falta ao juramento mesmo em seu prejuízo,
e não empresta dinheiro com usura.»
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LITURGIA DO TEMPO COMUM
(Ano B)
Escrito por frei Lopes Morgado
Após a Solenidade do Pentecostes, reentrámos no Tempo Comum, de que já tínhamos celebrado uma primeira parte entre a solenidade do Batismo do Senhor e quarta-feira de Cinzas. Então, no dia 15 de fevereiro celebrámos o VI domingo comum;
agora, nas semanas de 25 a 30 de maio, de 1 a 6 de junho
e de 8 a 13 de junho, celebramos a liturgia correspondente
à VIII, IX e X semanas do Tempo Comum;
mas, ao recomeçarmos a celebração dos domingos do Tempo Comum,
a 14 de junho, já estaremos no XI,
ficando assim, este ano, os domingos VIII, IX e X por celebrar.
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“O Senhor é o único Senhor”
31 de maio
SANTÍSSIMA TRINDADE
LEITURAS: 1ª: Dt 4,32-34.39-40. Salmo 33(32),4-5.6.9.19.20.22.
R/ Feliz o povo que o Senhor escolheu para sua herança. 2ª: Rm 814-17. Evangelho: Mt 28,16-20. Semana I do Saltério.
Durante 50 dias, fizemos a experiência do Filho de Deus ressuscitado, presente e ativo na Igreja e no Mundo pelo seu Espírito. Hoje somos chamados a celebrar conjuntamente o nosso Deus no mistério da sua Trindade e Unidade.
O apelo vem de Moisés, ao povo hebreu: «Considera hoje e medita no teu coração que o Senhor é o único Deus.»
Isso dá uma outra dimensão à nossa vida, porque faz de nós um povo diferente; povo chamado a escutar a voz desse Deus pessoal e único, a amá-lo como resposta às suas muitas «provas, sinais, prodígios, combates com mão forte e braço estendido, juntamente com tremendas maravilhas», e a anunciá-lo aos outros povos com uma vida mais perfeita, como a do nosso Pai (1ª Leitura).
A Liturgia da Palavra percorre toda a história da salvação, «desde o dia em que Deus criou o homem sobre a terra» (1ª), até à plenitude dos tempos, quando, sempre «conduzidos pelo Espírito de Deus», nos tornámos «filhos de Deus, herdeiros de Deus e herdeiros com Cristo»; pois, «se sofremos com Ele, também com Ele seremos glorificados» (2ª). E, para que essa história continue, somos enviados a fazer discípulos e a batizar, multiplicando os filhos de Deus: «Ide e fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a cumprir tudo o que vos tenho mandado». E assim, o Deus-connosco será Deus de todos e para todos (Evangelho).
Razão para aclamarmos: «Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo, ao Deus que é, que era e que há de vir» (Aleluia).
«Isto é o meu Corpo.
Este é o meu Sangue»
07 junho
SS. CORPO E SANGUE DE CRISTO
LEITURAS: 1ª: Ex 24,3-8. Salmo 116(115),12-13.15.16bc.17-18. R/ Tomarei o cálice da salva- ção e invocarei o nome do Senhor. 2ª: Heb 9,11-15. Evangelho: Mt 14,12-16.22-26. Semana II do Saltério.
Com a Solenidade do Corpo e Sangue de Cristo, a Igreja quer proclamar, no espaço público da cidade, o amor de Deus por nós, levado ao extremo na entrega de seu Filho na cruz e prolongado na Eucaristia. Isto porque, no dia da sua instituição em quinta-feira santa, o grande mistério da fé cristã foi celebrado apenas dentro das igrejas e com muita gente sem dispensa do trabalho ou a caminho de umas férias prolongadas.
As Leituras da palavra de Deus apresentam as raízes e motivações desta Festa. A 1ª Leitura decorre no Monte Sinai, onde o povo de Israel, por mediação de Moisés, renova a Aliança de fidelidade ao Deus único, evocado na solenidade da Santíssima Trindade. «Moisés veio comunicar ao povo todas as palavras do Senhor e todas as suas leis. O povo inteiro respondeu numa só voz: “Faremos tudo o que o Senhor ordenou”. Moisés escreveu todas as palavras do Senhor. No dia seguinte, levantou-se muito cedo, construiu um altar no sopé do monte e ergueu doze pedras pelas tribos de Israel. Depois mandou que alguns jovens israelitas oferecessem holocaustos e imolassem novilhos, como sacrifícios pacíficos ao Senhor. Moisés recolheu metade do sangue, deitou-o em vasilhas e derramou a outra metade sobre o altar. Depois, tomou o Livro da Aliança e leu-o em voz alta ao povo, que respondeu: “Faremos tudo quanto o Senhor disse e em tudo obedeceremos.” Então, Moisés tomou o sangue e aspergiu com ele o povo, dizendo: “Este é o sangue da aliança que o Senhor firmou convosco, mediante todas estas palavras”.»
Os elementos são suficientemente ricos para fazermos a relação entre este sacrifício de Jesus. E o Salmo Responsorial estabelece a relação e passagem: “Tomarei o cálice da salvação e invocarei o nome do Senhor.»
No Evangelho, Jesus, o novo Moisés, reúne os chefes do novo Povo de Deus e cumpre aquela aliança de um modo novo e eterno. E também o faz num rito judaico, envolto em textos da Sagrada Escritura e muitas orações (que algumas comunidades evocaram, no “Seder pascal”): «Enquanto comiam, Jesus tomou o pão, recitou a bênção e partiu-o, deu-o aos discípulos e disse: “Tomai: isto é o meu corpo.” Depois tomou um cálice, deu graças e entregou-lho. E todos beberam dele. Disse Jesus: “Este é o meu Sangue, o sangue da nova aliança, derramado pela multidão dos homens.”»
Na 2ª Leitura, o autor do sermão chamado “Carta aos Hebreus” apresenta o sacerdócio de Cristo superior ao da Antiga Lei: «veio como sumo-sacerdote dos bens futuros, atravessou o tabernáculo maior e mais perfeito e entrou de uma vez para sempre no santuário; «não derramou sangue de cabritos e novilhos, mas o seu próprio sangue, e alcançou-nos uma redenção eterna… Por isso, Ele é mediador de uma nova aliança».
Ao ser-nos facultado um dia especial, fora do domingo, para celebrarmos isto, é fácil de ver que não estávamos diante de um mero feriado, para o negociarmos em nome de um suposto maior rendimento económico; pois na Eucaristia oferecemos ao Senhor o «fruto da terra e do trabalho, que para nós se vão tornar pão da vida e vinho de salvação» (Ofertório). Que “valor acrescentado” maior do que este, podemos esperar do nosso trabalho, além de alimentarmos as pessoas com os bens da terra? Esquecê-lo, poderá levar à desumanização do trabalhador.
O cedro frondoso e a semente
14 de junho
XI DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Ez 17,22-24. Salmo 92(91),2-3.13-14. 15-16 R/ É bom louvar-Vos, Senhor. 2ª: 2 Cor 5,6-10.Evangelho: Mc 4,26-34. Semana III do Saltério.
A Palavra de hoje fala da providência e gratuidade de Deus, servindo-se de elementos da natureza para entendermos melhor nos explicar a mensagem. Quase me apetece convidar os visitadores desta página a visitarem também, o Jardim Bíblico no Centro dos Capuchinhos, em Fátima (na imagem), para a conferirmos e compreendermos à vista das árvores aqui referidas.
Na 1ª Leitura, o profeta Ezequiel tenta prevenir as autoridades e o povo de Judá de uma deportação semelhante à do Reino do Norte, que sucumbira sob a Assíria em 722 aC.. Para isso, denuncia a sua relação com o Egito e a confiança quase mágica no templo.
De facto, em 597, as tropas de Nabucodonosor invadem Jerusalém e destroem o templo, levando os principais para o exílio na Babilónia. Ezequiel, sacerdote e profeta, vai também. Aí, em nome de Deus, anuncia tempos novos: do cimo desse império, apresentado como um cedro alto, Deus cortará um ramo novo (o rei Jeconias, também deportado), com que iniciará uma nova plantação em Israel. E «ele lançará ramos e dará frutos e tornar-se-á um cedro majestoso. Nele farão ninho todas as aves, toda a espécie de pássaros habitará à sombra dos seus ramos».
O anúncio cumpriu-se em Jesus Cristo; o reino florescente já será o «reino de Deus», que Jesus apresenta no Evangelho com duas parábolas: a da semente lançada à terra, que segundo Marcos germina, cresce e dá trigo sem sabermos (bastante diferente da de Mateus 13,3-9.18-23); e a do grão de mostarda, que, «sendo a menor de todas as sementes», depois «torna-se a maior de todas as plantas da horta, estendendo de tal forma os seus ramos que as aves do céu podem abrigar-se à sua sombra» O paralelo destas parábolas com a 1ª Leitura é evidente.
O Salmo Responsorial vem ligar as parábolas à vida, com a referência a mais duas árvores:
«O justo florescerá como a palmeira,crescerá como o cedro do Líbano […]Mesmo na velhice dará o seu fruto,Cheio de seiva e de vigor.»
Por sua vez, o refrão do Aleluia ajuda a entender a semente da parábola do Evangelho:
«A semente é a palavra de Deus e o semeador é Cristo:quem O encontrar permanecerá para sempre.»
A explicação é importante, pois ajuda-nos a entender que o nosso objetivo ao ler a Bíblia não é tanto encontrar a palavra literária do escritor sagrado, embora Deus tenha encarnado nela, mas a mensagem ou o espírito de Deus que nela nos fala; e que o cristianismo não é, de facto, uma “religião do livro”, mas fundamenta a sua fé na pessoa de Cristo. «Caminhamos à luz da fé – diz Paulo na 2ª Leitura –, e não da visão clara.»
“A menina não morreu…”
28 de junho
XIII DOMINGO COMUM
LEITURAS:1ª: Sb 1,13-15; 2,23-24. Salmo 30(29), 2. 4.5-6.11.12a.13b R/ Eu Vos louvarei, Senhor, porque me salvastes. 2ª: 2 Cor 8,7.9.13-15. Evangelho: Mc 5,21-43. Semana I do Saltério.
Lidar com a morte, como fazendo parte da vida, é difícil para quem tem apetência de imortalidade também ao nível físico. Mas é uma realidade que temos de integrar na gestão da nossa existência. O autor da Sabedoria, situado entre 150 e 50 a.C., é peremptório: «Não foi Deus quem fez a morte, nem Ele se alegra com a perdição dos vivos… Deus criou o homem para ser incorruptível e fê-lo à imagem da sua própria natureza.» E argumenta: «Em nada existe o veneno que mata, nem o poder da morte reina sobre a terra, porque a justiça é imortal.» Mas, nele, morte identifica-se com perdição, e vida, com salvação. Por isso, ao explicar a causa da morte, responde assim: «Foi pela inveja do demónio que a morte entrou no mundo, e experimentam-na aqueles que lhe pertencem» (1ª Leitura).
Não era desta morte que estávamos a falar, dirão. Mas poderá ser, se julgarmos a realidade segundo a cultura e a teologia de então. E, mesmo hoje, porque recorrem tanto a Deus e aos santos, as pessoas doentes, apesar de tantos avanços científicos? Porque dizem os médicos, em casos terminais: “Se tem fé, reze”? Mas somos mais sensíveis à morte física e às doenças. O Evangelho fala de duas pessoas que acorrem a Jesus: o chefe da sinagoga, com uma filha a morrer, e «certa mulher que tinha um fluxo de sangue havia doze anos». Ambos os casos são resolvidos pela fé.
O Salmo ensina-nos uma coisa de que às vezes nos esquecemos;
ensina-nos a agradecer:
«Eu Vos glorifico, Senhor, porque me salvastes (…).
Tirastes a minha alma da mansão dos mortos.» (…)
Vós convertestes em júbilo o meu pranto:
Senhor meu Deus, eu Vos louvarei eternamente.»
“Filho do homem, Eu te envio…”
05 de julho
XIV DOMINGO COMUM
LEITURAS:1ª: Ez 2,2-5. Salmo 123(122),1-2a.2bcd. 3-4 R/ Os nossos olhos estão postos no Senhor, até que se compadeça de nós. 2ª: 2 Cor 12,7-10. Evangelho: Mc 6,1-6. Semana II do Saltério.
Em tempos de apelo à evangelização, Ezequiel relata o seu chamamento ao apostolado: «O Espírito entrou em mim e fez-me levantar. Ouvi então Alguém que me dizia: “Filho do homem, Eu te envio aos filhos de Israel, a um povo rebelde que se revoltou contra Mim”».
A iniciativa é de Deus. O profeta não escolhe o campo de missão nem os destinatários da mensagem: «É a esses filhos de cabeça dura e coração obstinado que te envio.» E é-lhe dito o que deve transmitir: «Eis o que diz o Senhor.»
Assim, só será responsabilizado no caso de se calar. Mas, que outra responsabilidade poderá ter, se Deus é o único Salvador? «Podem escutar-te ou não – porque são uma casa de rebeldes –, mas saberão que há um profeta no meio deles.» Só isso nos é pedido: dispormo-nos a revelar o Deus que fala pelas nossas palavras; a resposta ao anúncio já é da responsabilidade de cada um (1ª Leitura).
Claro que a resposta pode ser comprometida por quem faz a proposta, pois apresenta-se em nome de Deus. Mas, atenção às leituras apressadas: às vezes parte-se o frasco para não ter que tomar o medicamento que podia curar.
Jesus era quem era e foi rejeitado na sua terra. Até Ele «estava admirado com a falta de fé daquela gente.» Mas, que fez? Desistiu e calou-se? Não: «percorria as aldeias dos arredores, ensinando» (Evangelho).
Como Ezequiel, Isaías, Jesus e Paulo (2ª), os batizados podemos dizer:
«O Espírito do Senhor está sobre mim: Ele me enviou a anunciar o Evangelho» (Aleluia).
E temo-lo anunciado?
«Como os olhos da serva
se fixam nas mãos da sua senhora,
assim os nossos olhos se voltam para o Senhor nosso Deus,
até que tenha piedade de nós» (Salmo Responsorial).
“ Vai profetizar ao meu povo…”
12 de julho
XV DOMINGO COMUM
LEITURAS:1ª: Am 7,12-15. Salmo 85(84),9ab-10.11-12.13-14. R/ Mostrai-nos, Senhor, o vosso amor e dai--nos a vossa salvação. 2ª: Ef 1,3-14. Evangelho: Mc 6,7-13. Semana III do Saltério.
A Palavra, hoje, complementa a de domingo passado. No séc. VIII a.C., Amós vivia no reino do Sul. Guardava tranquilamente o seu gado e cultivava sicómoros, quando se sentiu chamado a ir falar em nome de Deus no reino do Norte: «Vai profetizar ao meu povo de Israel.»
Estando ele a pregar no santuário real de Betel aquilo que o povo precisaria de ouvir, o sacerdote local, para não perder os favores do rei, tentou demovê-lo: «Vai-te daqui, vidente. Foge para a terra de Judá. Aí ganharás o pão com as tuas profecias.»
Mas ele não se vendeu, e resistiu: «Eu não era profeta nem filho de profeta… Foi o Senhor que me tirou da guarda do rebanho e me disse…».
E foi dos profetas mais corajosos a denunciar a corrupção e a exploração. Muito atual! Leia o seu livro, nestes dias (1ª Leitura).
O Evangelho, em paralelo com a 1ª Leitura, apresenta o chamamento e envio dos Apóstolos. Também eles são escolhidos gratuitamente por Jesus, dentre os discípulos, são enviados, partem e entregam-se à missão… Pregam o arrependimento, expulsam demónios, ungem doentes com óleo e curam-nos.
E nós? «Bendito seja Deus, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que do alto dos Céus nos abençoou com toda a espécie de bênçãos espirituais em Cristo. N’Ele nos escolheu, antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis, em caridade, na sua presença. Ele nos predestinou, de sua livre vontade» (2ª Leitura).
Não somos condicionados: somos especialmente escolhidos e amados por Deus.
Qual a nossa resposta?
«Deus, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo,
ilumine os olhos do nosso coração,
para sabermos a que esperança fomos chamados» (Aleluia).
“O Senhor é meu pastor”
19 de julho
XVI DOMINGO COMUM
LEITURAS:1ª: Jr 23,1-6. Salmo 23(22),1-3a.3b-4.5.6. R/ O Senhor é meu pastor: nada me faltará. 2ª: Ef 2, 13-18. Evangelho: Mc 6,30-34. Semana IV do Saltério.
No IV domingo da Páscoa, chamado “domingo do Bom Pastor”, muitos párocos terão sido acarinhados pela sua comunidade.
Neste, a 1ª Leitura dirige-se a outros “pastores” do povo, que à luz dela podem fazer uma revisão sobre o modo como o servem ou se servem dele: o poder político e judicial, os deputados, autarcas e funcionários públicos.
Poderá ser para eles a recriminação de Deus aos maus pastores do seu povo: «Dispersastes as minhas ovelhas e as escorraçastes, sem terdes cuidado delas. Vou ocupar-me de vós e castigar-vos, pedir-vos contas das vossas más acções…».
Deus era representado pelos poderes civis, que não eram donos do povo, mas seus servidores (é o sentido de “ministro”). E porque não o serviam, foram removidos: «Dar-lhes-ei pastores que as apascentem e não mais terão medo nem sobressalto; nem se perderá nenhuma delas. Dias virão em que farei surgir para David um rebento justo. Será um verdadeiro rei e governará com sabedoria; há-de exercer o direito e a justiça. Nos seus dias, Judá será salvo e Israel viverá em segurança.»
Isto é mesmo para hoje!
O Salmo celebra a imagem de Deus, como bom pastor:
«O Senhor é meu pastor: nada me falta.
Leva-me a descansar em verdes prados,
conduz-me às águas refrescantes
e reconforta a minha alma».
O Evangelho incarna-o na pessoa de Jesus: acolhe os Apóstolos vindos da missão (domingo passado), dá-lhes descanso «e compadeceu-se de toda aquela gente, que eram como ovelhas sem pastor.»
Como Paulo bem diz, «Cristo é, de facto, a nossa paz» (2ª Leitura).
“Comerão e ainda há de sobrar”
29 de julho
XVII DOMINGO COMUM
LEITURAS:1ª: 2 Rs 4,42-44. Salmo 145(144),10-11. 15-16.17-18. R/ Abris, Senhor, as vossas mãos e saciais a vossa fome. 2ª: Ef 4,1-6. Evangelho: Jo 6,1-15. Semana I do Saltério.
A partir deste domingo, até ao XXI (23 de agosto), a liturgia serve-nos, no Evangelho, todo o capítulo VI de S. João, chamado “discurso do pão da vida”. Isso fará com a 1ª Leitura nos proporcione sempre um texto paralelo do Antigo Testamento, em que hoje encontramos figuras da Eucaristia. À luz dos dois textos, veremos, com maior força de compromisso, os nossos problemas atuais de solidariedade e partilha de bens.
Na 1ª Leitura surge Eliseu, sucessor de Elias e com mais poder taumatúrgico do que ele. Após ter enchido, com uma só ânfora de azeite, todas as que uma mulher e as vizinhas tinham em casa, para ela pagar uma dívida, faz com que vinte pães de cevada cheguem para matar a fome a cem pessoas.
No Evangelho é Jesus a alimentar cinco mil pessoas com cinco pães de cevada e dois peixes, que «um rapazito» disponibiliza para todos. Na multiplicação, Jesus faz quase os gestos da última ceia: «tomou os pães, deu graças e distribuiu-os.» Aliás, em João, é este o relato da instituição da Eucaristia, que ele omite na última ceia de Jesus.
Quer dizer que estava na intenção do evangelista relacionar a Eucaristia com a partilha; e os cristãos entendiam que os atos solidários com os outros membros da comunidade nasciam da comunhão do corpo de Jesus. Porque «há um só Corpo e um só Espírito… um só Deus e Pai de todos» (2ª Leitura).
Um pormenor: a multidão tinha tanta fome da palavra, que descurou o alimento; mas, quem ouviu a palavra, repartiu-o. Agradeçamos ao Senhor, com o Salmo:
«Graças vos deem, Senhor, todas as criaturas
e bendigam-vos todos os fiéis.
Proclamem a glória do vosso reino
e anunciem vossos feitos gloriosos.
Todos têm os olhos postos em Vós,
e a seu tempo lhes dais o alimento.
Abris as vossas mãos
e a todos saciais generosamente.
O Senhor é justo em todos os seus caminhos
e perfeito em todas as suas obras.
O Senhor está perto de quantos O invocam,
de quantos O invocam em verdade.»
«O Senhor… »
E nós…? Até quando?
O HOMEM, A MULHER E A FAMÍLIA
04 de outubro
XXVII DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Gn 2,18-24. Salmo 128/127, 1-2.3.4-5.6 R/ O Senhor nos abençoe em toda a nossa vida. 2ª: Heb 2,9-11. Evangelho: Mc 10,2-16. Semana III do Saltério.
Os textosdehojeconvidama refletir sobre a família em geral e a família de cada um, confrontando o sonho das origens com a realidade da vida. A 1ª Leitura apresenta o projeto do Criador, na 2ª versão bíblica das origens, onde o ser humano surge no topo da obra de Deus e responsável por ela, como na 1ª versão, pois é ele que lhes impõe o nome.
Em forma poética, diz-nos: Deus fez o homem como ser de relação, para dialogar e partilhar a vida com alguém: «Não é bom que o homem esteja só.» Esse alguém deve ser da suaespécie e natureza:entretodos os animais e aves, «não encontrou uma auxiliar semelhante a ele»; por isso Deus a forma de uma costela do homem, para dizer que é da sua espécie e tem a mesma dignidade, mas nãoédomesmogénero,aocontrário do que hoje se pretende impor. Como a Bíblia já dissera na 1ª versão da criação, «Ele os criou homem e mulher» (Gn 1,27).
«Por isso, o homem deixará pai e mãe para se unir à sua esposa, e os dois serão uma só carne». O texto supõe que de modo exclusivo e definitivo. Assim o interpretou Cristo, à pergunta dos fariseus: «Pode um homem repudiar a sua mulher?» Disse: «não separe o homem o que Deus uniu.» E acrescentou: «Quem repudiar a sua mulher e casar com outra, comete adultério com a primeira. E se a mulher repudiar o seu marido e casar com outro, comete adultério.»
A solução está no amor, diz o verso do Aleluia. E o Salmo canta uma família: marido ganhando o sustento com o seu trabalho, esposa «como videira fecunda» e «filhos como ramos de oliveira,/ ao redor da tua mesa».
O ESPÍRITO DE SABEDORIA
11 de outubro
XXVIII DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª:Sb 7,7-11. Salmo 90/89,12-13.14-15.16-17. R/ Enchei-nos, Senhor, da vossa misericórdia: será ela a nossa alegria. 2ª: Heb 4,12-13. Evangelho: Mc 10,17-30.Semana IV do Saltério.
O «homem»doEvangelho(e não falemos do «jovem» rico, todos os anos, pois só Mateus é que fala de um «jovem»!) não teve «o espírito de sabedoria». E ele até começou muito bem: aproximou-se de Jesusa correr, ajoelhou-se diante d´Ele e perguntou-lhecommuitoboaintenção:«Bom Mestre, que hei de fazer para alcançar a vida eterna?» E até cumpria todos os mandamentos «desde a juventude» (por isso, já não era um jovem…).
Só não teve «o espírito de sabedoria», porque o sábio a quem ela foi concedida
«preferiu-a «aos cetros e aos tronos
e, em sua comparação, considerou a riqueza como nada
(…) pois todo o ouro, à vista dela, não passa de um pouco de areia
e, comparada com ela, a prata é considerada como lodo»» (1ª Leitura).
Ele, ouvindo o convite de Jesus a dar tudo aos pobres e segui-lo, para ter um tesouro do Céu, «retirou-sepesaroso,porqueeramuitorico».Eassim, aonão querer arriscar nada para garantir o que desejava, pôs em risco a vida eternaqueinicialmentepretendia alcançar: «Como sé difícil paraosquetêmriquezasentrarnoreinode Deus!» E, com essa incapacidade para avaliar as coisas, talvez nem tenha tirado grande partido da sua riqueza.
No Salmo pedimos: Senhor, «ensinai-nos a contar os nossos dias.»
Quantos teria ainda aquele homem, para perder aoportunidadedo negócio da sua vida – ser discípulo de Jesus?!
«A palavra de Deus é viva e eficaz, (…)
é capaz de discernir os pensamentos e intenções do coração» (2ª Leitura).
Deixemo-la discernir em nós o que melhor convém à nossa vida.
“PARA SERVIR E DAR A VIDA”
18 de outubro
XXIX DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: Is 53,10-11. Salmo 33/32,4-5.18-19.20.21. R/ Desça sobre nós a vossa misericórdia, porque em Vos esperamos, Senhor. 2ª: Heb 4,14-16. Evangelho: Mc 10,35-45. Semana I do Saltério. DIA MUNDIAL DAS MISSÕES.
Voltamos à ideia central do domingo passado: a arte de saber investir a vida para ganhá-la. A 1ª Leitura dá-nos apenas dois versículos do IV Cântico do Servo, sobre Paixão e Glória, mas neles temos a síntese de toda a mensagem: o Senhor quis «esmagar o seu Servo pelo sofrimento», porque é fonte de vida e sabe que faz parte da vida morrer para dar fruto. Não é por sadismo. Daí o sofrimento não ser imposto: só vale «se o Servo anónimo oferecer a sua vida como vítima de expiação»; nesse caso,«teráumadescendênciaduradoira,viverá longos dias, e a obra doSenhorprosperaráemsuas mãos. Terminados os sofrimentos, verá a luz e ficará saciado.» E, deste modo, «pela sua sabedoria, o Justo, meu Servo, justificará a muitos e tomará sobre si as suas iniquidades». Ao servir, dá a vida e dá vida. «Na verdade, quem quiser salvar a sua vida, há de perdê-la; mas, quem perder a sua vida por causa de mim e do Evangelho, há de salvá-la» (Mc 8,35).
Eis porque o rico do domingo passado fez um mau negócio. Como poderá suceder-nos, se nos quisermos salvar apenas a nós; este Dia Mundial das Missões lembra-nos que devemos procurar fazê-lo preocupando-nos com a salvação dos outros. Foi o que fez São Lucas, o evangelista deste ano, que hoje celebramos: deixando o conforto da sua comunidade, juntou-se a Paulo na evangelização, manteve-se fielmente junto dele, e pelo seu testemunho ganhou a confiança da Igreja que o promoveu de discípulo a evangelista com especial atenção aos pagãos, aos pecadores e aos mais desfavorecidos ou marginalizados, como os doentes, os pecadores e as mulheres.
A profecia do Cântico do Servo cumpre-se em Jesus – o Messias-Mestre que nos salvou pelo sofrimento. Por isso, no Evangelho, Ele desafia «Tiago e João, filhos de Zebedeu», a beber o cálice da suaPaixãopara obterem, pelo “serviço”, os dois lugaresde honra na sua glória, que pretendiam obter por “cunha” ou “favor”: «quem entre vós quiser tornar-se grande, será vosso servo, e quem quiser entre vós ser o primeiro, será escravo de todos; porque o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida pela redenção de todos» (Evangelho). Esta última frase, em que Jesus se propõe como modelo de serviço, é a que a Liturgia seleciona para o refrão do Aleluia.
«Permaneçamos firmes na profissão da nossa fé» - exorta o autor da Carta aos Hebreus (2ª Leitura), lembrando que temos nos Céus um sumo-sacerdote, «Jesus Cristo, Filho de Deus», que passou por toda a provação, exceto a do pecado. «Vamos, portanto, cheios de confiança ao trona da graça, a fim de alcançamos misericórdia e obtermos a graça de um auxílio oportuno».
Apoiados nesta confiança, rezamos o refrão do Salmo Responsorial:
«Desça sobre nós a vossa misericórdia,
porque em Vós esperamos, Senhor.»
E proclamamos, com o Salmista:
«A nossa alma espera o Senhor:
Ele é o nosso amparo e protetor.»
“EU SOU UM PAI PARA ISRAEL”
25 de outubro
XXX DOMINGO COMUM
LEITURAS: 1ª: J 31,7-9. Salmo 126/125,1-2ab.2cd-3.4-5.6. R/ O Senhor fez maravilhas em favor do seu povo. 2ª: Heb 5,1-6. Evangelho: Mc 10,46-52. Semana II do Saltério.
O título deste comentário é da 1ª Leitura, que diz: «O Senhor salvou o seu povo, o resto de Israel.» Nela, o profeta Jeremias descreveantecipadamenteo regresso à pátria dos exilados em Babilónia, exortando: «Soltai brados de alegria.» O texto é belo e comovente, ultrapassando a realidade:
«Vou trazê-los das terras do Norte
e reuni-los dos confins do mundo.
Entre eles vêm o cego e o coxo
a mulher que vai ser mãe e a que já deu à luz.
É uma grande multidão que regressa.
Eles partiram com lágrimas nos olhos
e Eu vou trazê-los no meio de consolações.»
Diria que o grande regresso/êxodo deste povo ainda não terminou; mas hoje tem outros contornos.
O Salmo confirma: «O Senhor fez maravilhas em favor do seu povo.» Evoca o mesmo regresso dos cativos de Sião, que fazia exclamar os pagãos: «O Senhor fez por eles grandes coisas.» E dá confiança a todos os expatriados:
«À ida vão a chorar,
levando as sementes;
à volta vêm a cantar,
trazendo os molhos de espigas.»
Temos que ler e rezar mais os salmos que, não apenas na Liturgia, fazem a ponte entre o Antigo Testamento, o Novo e a vida.
Deus diz-nos, cada dia, o que diz de seu Filho Jesus: «Tu és meu filho, Eu hoje te gerei» (2ª Leitura). Ser pai é isso. E não apenas gerar de uma vez, porque nós estamos – ou devemos estar – sempre a nascer de novo. Por isso Ele é, também para nós, um Pai.
Jesus cura um cego: «Vai, a tua fé te salvou» (Evangelho). E ele segue-o, feliz. Uma lição para os Apóstolos, que o seguiam «assombrados e temerosos» (Mc 10,32).